quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

Menino Jesus, Pai Natal?

Já não sei quem manda aqui!

Nã importa um beijo pa todos., tá?



.


A Todos Um Bom Natal - Coro Infantil De Santo Amaro D

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Orçar

Já fomos muito bons marinheiros, aprendendo naufragando aqui e acolá, estudando e inventando aprendendo e ensinando, fizemo-nos aos mundo, enriquecemos e lamentavelmente empobrecemos, não por os recursos terem escasseado, mas porque à competente ciência naval não correspondeu uma competente governação política. O nosso Rei-Sol, D. João V, para sua glória, e nossa desgraça, deixou-nos o Convento-palácio de Mafra mais os seus carrilhões para conservar, num esforço que agora padecem muitas Blimundas e Sete-soís.

Depois com o advento da industrialização, os veleiros deram lugar aos vapores e paquetes. Foi um soltar de amarras e o proliferar de marinheiros. Para marinheiro passou a ser necessário saber fazer nós, fáceis de desfazer, soltar amarras, virar a proa a um destino e confiar que o São GPS (1) não falhe. Agora, marinheiros há muitos, mais do que as marés e tantos como os chapéus. Em cada jetski há um e em cada mota d’água dois ou três.

A navegação à vista de costa é, aparentemente, mais segura mas convém que não nos aproximemos demasiado pois ficamos mais sujeitos a percalços: golpes de mar; baixios ou rochedos submersos. Para passear serve, mas para quem tem um ponto de chegada longínquo, outro galo canta. Sabendo estimar a posição em que nos encontramos, em cada momento, há que manter o aparelho (2) afinado e se necessário, para vencer ventos contrários, bem saber bolinar (3) cerrando os dentes dispostos a fazer das tripas coração. Mas tal ainda não chega pois se em geometria a distancia mais curta entre dois pontos é uma recta, no mar o propósito não se alcança num só rumo, para lá chegar, mais rápida e seguramente, é preciso saber de ventos e correntes.
Orçar (4) não chega.

(1) GPS- Sistema de navegação por satélite
(2) Aparelho – conjunto de cabos, poleame e velame de um navio
(3) Bolinar – Navegar chegado ao vento, ou seja, próximo da direcção do vento.
(4) Orçar – Aproximar a proa da direcção do vento.
.

terça-feira, 14 de outubro de 2008

A crise já vem de muita longe

O nosso imaginário reflecte a imagem de Padeiras de Aljubarrota e Marias da Fonte. As nossas heroínas projectam, nos filhos, pelo menos neste filho da mãe, criado ao vosso dispor, valores que se foram tornando em dogmas.

A minha rica padeirinha, corajosa, capaz de enfrentar à pazada sete valentes castelhanos, não tem a existência confirmada e, reza a lenda, era feia que nem um bode não lhe faltando profícuos folículos pilosos.

A Maria, da tal Fontarcada, personificou a luta do povo contra: o recrutamento militar; a obrigatoriedade do registo de propriedades para introdução da contribuição predial; a proibição de enterros em igrejas, por questões de saúde pública.
Os Cabrãolistas, vai de impor; os mais avessos ao progresso, principalmente nas zonas rurais de acentuado fanatismo religioso, e os sobreviventes pró-absolutistas, vai de aproveitar a cena.


O rastilho aceso no Minho, rapidamente incendiou as Beiras, Trás-os-Montes e a Estremadura. (…) “feita por homens de saco ao ombro e de foice roçadora na mão, para destruir fazendas, assassinar, incendiar a propriedade, roubar os habitantes das terras que percorrem e lançar fogo aos cartórios, reduzindo a cinzas os arquivos”. Tal ia a moenga, heim!


Moral da história: cuidado com os mitos (principalmente os feios), porque para mito basto eu, e a Padeirita, coitada, se estava a ser fodida pelos liberais, não se livrou de ser enrabada belos absolutistas, que senhores duma ganda peida, para ela se estavam cagando.


Bom já viram que liberais e "neon"-liberais, nã papo e absolutistas nêm chêrari. Atão, (perguntam vocemessês) por aí nã se papa nada?

Pronto, vá lá, confesso que por vezes, com ou sem laranja, pactuo absolutamente.


Maria da Fonte - Vitorino

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Mesmo sem convite

Nã sê dançar, nã sê cantar e canto, por vezes danço levado a reboque desta ou daquela.
...
Recolhi-me naquela sala vermelha fugindo de um luar que me sufocava, que roubava o brilho às estrelas para o entregar, cúmplice da humidade fria da noite, à pedra da calçada. Aqui prevalece a penumbra, as palavras ciciadas não adquirem significado, os gestos são lentos, aparentemente calmos; as mesas abandonadas fazem companhia aos instrumentos lá no canto, aquele cigarro esquecido, esvaindo-se, liberta o fumo que desaparece no ar, mas dele fica o doce cheiro.

Vou sorvendo a bebida que me aquece a alma fria à medida que me afasto no tempo, resistindo ao regresso do vermelho desta sala turbulenta aquecida no embalado movimento de corpos e olhos colados, na cadencia sincopada das notas libertadas de um piano e do acordeão que abraças em meneio do corpo e, resisto, à perseguição do teu olhar vergando o meu. Não é verdade que estejas diante de mim, que me tomes e me arrastes, me domes a compasso de um piano tocando só; como marioneta presa dos teus dedos, suspensa nos teus braços e do calor da tua respiração, perco-me. Quero esquecer, o que, mudamente, disseste com o arquear de sobrancelhas, e me apartares do teu copo, rodopiando; quero esquecer as promessas que fizeste com os lábios fechados, ao tomares-me de novo; quero esquecer a última nota do piano pairando no ar, o teu corpo sobre mim debruçado, tal como a melodia do teu rosto.
Soam acordes, para me despertarem, trazerem a esta sala vermelha, quase cheia; o piano ataca seguido de um violino, um par entrelaça-se, por um momento quietos, desafiam-se num olhar e partem sem acordeão.

Quase tudo te perdoo, mas o teres levado outra na tua última viagem de mota, não. Um dia esquecerei o teu rosto, até o teu cheiro, talvez.

Percanta que me amuraste
en lo mejor de mi vida,
dejándome el alma herida
y esplín en el corazón,
sabiendo que te quería,
que vos eras mi alegria
y mi sueño abrasador,
para mí ya no hay consuelo
y por eso me encurdelo
pa´olvidarme de tu amor

Cuando voy a mi cotorro
y lo veo desarreglado,
todo triste, abandonado,
me dan ganas de llorar;
me detengo largo rato
campaneando tu retrato
pa´poderme consolar.

Ya no hay en el bulín
aquellos lindos frasquitos
adornados con moñitos
todos del mismo color.
El espejo está empañado
y parece que ha llorado
por la ausencia de tu amor.

De noche, cuando me acuesto,
no puedo cerrar la puerta,
porque dejándola abierta
me hago la ilusión que volvés.
Siempre llevo bizcochitos
pa´tomar con matecitos
como si estuvieras vos,
y si vieras la catrera
cómo se pone cabrera
cuando no nos ve a los dos.

La guitarra en el ropero
todavía está colgada,
nadie en ella canta nada
ni hace sus cuerdas vibrar.
Y la lámpara del cuarto
también tu ausencia ha sentido
porque su luz no ha querido
mi noche triste alumbrar.

Mi Noche Triste - Francisco Canaro

domingo, 12 de outubro de 2008

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

João Silva IV

Deixo aqui o último testemunho que prefacia o Rocha Cheneider.
João Silva tem dois filhos que lhe sacaram os "defeitos", dedicou-se à agricultura e pecuária, lá para os lados da Cela, imagino que tivesse plantado árvores, e deixa-nos um belo livro. Nada disto seria necessário que tivesse feito para ser um grande homem, o caracter a isso o condenou, se nasceu com ele ou se ele o construiu, não sei nem me importa. A ele lhe devo também o, pouco, que tenho de bom.



«ISSO FAZ-ME LEMBRAR UMA HISTÓRIA...»

A memória mais antiga que temos dele é do som da sua voz, quando ainda lhe cabíamos no colo e ele nos embalava com os mistérios do mato, dos ani­mais, do mundo mágico do cinema, do teatro e da fotografia.
«Isso faz-me lembrar uma história...» Quantas vezes ao longo dos anos não ouvimos isto? Quantas vezes não bastava um pequeno pormenor, uma palavra, um vulto que passava, uma expressão escutada, uma música, uma fotografia, uma pintura, a referência a um livro ou autor, para que ele fosse por aí fora, desfiando memórias deliciosas de um tempo perdido.
A família, os amigos, todos sabem como qualquer detalhe serve para que mais um pedaço de uma vida cheia nos fosse desvendado.
«Isso faz-me lembrar uma história...» E lá ia ele, pelas ruas da Alfama dos anos 20 do século passado, pelos estúdios da Tobis da época áurea do cine­ma português, pela prisão dos Açores, por um recanto remoto da Angola dos anos 50.
Estivéssemos à mesa de jantar, numa tertúlia com amigos; estivesse ele no autocarro da Carris, apanhado anos a fio, manhãzinha cedo, a caminho da CGTR Tudo servia para nele despertar uma memória. E quem o ouvia sorria, na certeza de encontrar ali uma história política, um pormenor pitoresco, o descrever de um tipo humano, tantas vezes razões para se emocionar.
Vantagens dos cabelos brancos, dirão da facilidade com que desfiava memórias como quem respira. Vantagens de quem viveu uma vida cheia, dizemos nós. De quem lutou pela liberdade num tempo em que era palavra proibida, de quem privou com vultos maiores do cinema português, de quem palmilhou (a expressão é a correcta, foi mesmo palmo a palmo) aquele semi-continente selvagem e maravilhoso que é Angola.
Mas o João que nós conhecemos não é só o magnífico contador de estorias. É um pai atento e um avô dedicado. Firme na hora de nos fazer estudar e respeitar os compromissos. Pleno de energia quando nos levava a nadar, a jogar à bola ou a correr pela marginal. Cada um de nós tem as suas ideias e seguiu livremente o seu caminho. Mas todos, sem excepção, fomos beber ao que o João nos ensinou quando se tratava de respeitar o próximo, lutar por uma sociedade mais justa ou não perdermos nunca a capacidade de nos indignarmos perante uma injustiça.
Há uns poucos anos, quando as pernas deixaram de lhe responder com a rapidez que a cabeça pedia, decidiu-se. «Como é isso dos blogues?», pergun­tou, naquela curiosidade permanente de miúdo, com os olhinhos a brilhar. De então para cá, dezenas, centenas de histórias foram sendo postas a escrito. Sem outro critério que não fosse o ir pondo no papel (ou melhor, no ecrã) episódios que viveu. Ingénuos, uns, dolorosos outros, alegres, outros ainda. Mas episódios que dificilmente nos deixam indiferentes. Não é uma história do último século que aqui é posta a escrito. Longe disso. Mas são histórias, episódios, que ajudam a perceber aquilo que somos e de onde vimos.
«Isso faz-me lembrar uma história...»


A Família


Bolero de Ravel (adaptação para sete pianos) - A Eremine-A Rosado-F Neves- J Mota- L Filipe Sá-M Coelho-P Burmester

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Porque será?

No total, 42 pessoas, entre elas:

Charles Pasqua, 81 anos e ex-ministro do Interior,
Jean-Christophe Mitterrand (filho de François Mitterrand, antigo presidente francês),
Pierre Falcone, empresário de 54 anos, e
Arcadi Gaydamak, 61 anos, milionário israelita,
vão ser ouvidos pelo alegado envolvimento no caso.
e...


Luanda pede ao tribunal de Paris anulação do caso 'Angolagate'




O Que Será (À Flor Da Pele) - Various Artists - José Mário Branco, Canto Nono

Crises

Beatriz M. e Linda A.
Duas mulheres que têm tendência para saltar para o outro lado da vida.
Saltaram o muro de uma vida em liberdade e aos olhos implantados em cabeças escorreitas, com formatações perfeitas mas de vistas estreitas, ousam construir os seus próprios afectos que infectos aos vigilantes olhares que as rodeiam os vêem como impróprios, merecendo tal namoro tratamento digno de filhos de Montéquio e Capuleto, pelo que estão apartadas, despojadas de seus bens.
Está montada a trama para que entre Frei Lourenço. No elenco, entra a matar Fernando Namora que, espero, se a alguma der um elixir que iluda os carrascos, não se esqueça de contar à outra o final da tragédia de Romeu e Julieta.
Com tanta crise material, para quê a moral?


quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Peixes



Não alinho em determinismos mas às vezes ponho-me a pensar.

João Silva III

UMA JUSTA HOMENAGEM

A obra que agora lançamos representa uma justa homenagem da CGTP-IN, e dos colegas que com ele tiveram o privilégio de trabalhar, ao João Silva, repórter fotográfico desta Confederação entre 1979 e 2007.
O conjunto de textos que a compõem são o resultado de uma selecção de muitos outros que o João um dia deixou na CGTP-IN e alguns a que tivemos acesso através da sua família. A sua organização nos nove capítulos em que se encontra estruturada a obra é da nossa responsabilidade e procurou, so­bretudo, destacar a variedade e riqueza de experiências de que as respectivas histórias de vida são o testemunho.
O homem tem momentos sublimes de enamoramento, por uma pessoa, uma ocupação, pela vida. João Silva consegue transmitir esse enamoramen­to constante nas suas palavras, nos seus gestos, em cada expressão do seu rosto. E a força e vivacidade desses momentos são visíveis nas pessoas que o rodeiam e acarinham, reflectem-se na sua boa disposição, no sorriso, às vezes gargalhada, no semblante melancólico ou nostálgico, enfim, nas mais variadas emoções que as multifacetadas histórias do João conseguem des­poletar nos seus interlocutores.
E a natureza da escrita que caracteriza estes textos é, necessariamente, o reflexo dessa faceta de um sedutor contador de histórias. Trata-se, portanto, de uma escrita com a marca da oralidade que precedeu o seu registo, uma escrita escorreita, acessível, viva e que, à medida que nos conduz pelos mais diversos percursos, nos presenteia, nos recompensa, com os odores, o co­lorido, os sons de uma Alfama dos anos vinte e trinta, de uma África entre os anos cinquenta e setenta, com as peripécias nos bastidores do cinema português das décadas de trinta e quarenta do século passado e as afoitas
tentativas de fuga das prisões por onde passou, enfim, com o humor, a ironia e a sensibilidade que pontuam estes relatos e caracterizam o seu autor.
Uma última nota sobre o trabalho que queda por fazer quanto à preservação da memória daqueles camaradas que trabalharam na CGTP-IN e no Movimen­to Sindical Unitário, em geral, e aqueles que coordenaram a sua actividade ao longo destes anos de história. A edição deste livro representa para a CGTP-IN um importante compromisso face ao trabalho de preservação e valorização da sua memória. Entendemo-lo como uma espécie de "alavanca", recupe­rando a designação do jornal produzido pela CGTP-IN logo a partir de 1974 e para o qual também contribuiu, com o seu labor empenhado e incansável, o João Silva.
A todos quantos contribuíram para a concretização desta homenagem, sau­dando, em particular, a família do João, o nosso reconhecido agradecimento.


Fernando Gomes
Departamento de Cultura e Tempos Livres
CGTP-IN

terça-feira, 7 de outubro de 2008

Sim, onde estão?

Interroga, hoje no DN, Mário Soares.
Porventura, nesta batida, estão na porta certa e na forma certa: quietos e vigilantemente pacientes. No momento certo visarão a sua presa com grande probabilidade de não falharem.
Não estamos onde estamos por acaso. Estamos aqui porque um projecto de construção de um estado social foi metido na gaveta por quem podia e mandava, e porque quem o deveria defender, não conseguiu erguê-lo. Uma economia de estado detentora da banca, da energia, dos transportes, dos seguros, da saúde e da educação entendeu por bem privatiza-los ou abri-los à iniciativa privada. Ainda bem que o fizeram porque as empresas estatais serviram mal e muito pior serviram os que dela faziam parte: dos porteiros aos presidentes das administrações. As razões de tão mal serviço são tantas que é melhor, por agora, não ir muito mais longe.
De Aeroporto, onde não sei, pecisamos; de TGV se precisarmos não será imediatamente fundamental, de uma quarta operador de telefones móveis não será necessário para regular o serviço e desregular a sua, actual, actividade concertada, mas está aí!!!
Tudo o que dê lucro, do lixo à água, está na mira tanto dos neo-liberais como da camorra. Em Portugal progredimos em movimento fortemente acelerado para entregar a exploração da água à iniciativa privada, a isto opõe-se um movimento baseado em estruturas afectas ou próximas do PCP, isso mesmo: Partido Comunista Português, papador de criancinhas ao pequeno almoço, o que dá logo para desconfiar e pôr de lado, né?
Bom, os ne-liberais, já a gente sabe onde estão e os socialistas?
Pique para aumentar

JOÃO SILVA, II

O COMUNICADOR

Tinha que ser. As fabulosas memórias e histórias de João Silva não se podiam perder.
Incluo-me entre aqueles que insistiram para que ele passasse a papel ou a outro suporte duradouro os divertidíssimos episódios por ele vividos ou presenciados e que, de viva voz, nos foi contando ao longos de anos de convivência e amizade, em almoços, encontros, viagens e, aqui que ninguém nos ouve, no próprio local de trabalho. Foram momentos de profundos prazer e aprendizagem.
De prazer, porque João Silva é dotado de um poder de comunicação que pede meças a muitos comunicadores encartados, com a vantagem de ser senhor de um humor fino e inteligente. Ouvi-lo é uma delícia, sempre. Onde ele está é uma festa.
Mas ao mesmo tempo sentimos estar perante um homem sério, de vas­ta cultura e duma mundividência fora do comum, demonstrando, em cada momento, que nada do que é humano lhe é estranho. A sua memória não vacila e, malgrado não ter frequentado academias nem elites intelectuais, impressionam o leque e o volume dos seus conhecimentos. Bento de Jesus Caraça, cujo funeral João Silva filmou e por via disso foi pela segunda vez parar aos calabouços da polícia política, teria sem dúvida rejubilado por encontrar nele os elementos fundamentais do que designava de cultura integral do indivíduo, isto é, uma cultura com sentido ético, que se adquire em contacto com o mundo e intervindo sempre no sentido de fazer desse mundo um lugar melhor, porque mais justo. Homens deste calibre não são, infelizmente, assim tão frequentes.
Estou convencido de que João Silva sempre entendeu ser esta a primeira condição para se sentir bem consigo próprio. O seu conceito de felicida­de passa por aqui. Esta tem sido a plataforma segura donde tem tomado balanço para novas aventuras e experiências, incluindo esta de, aos 90 anos, abalançar a escrever Rocha Chenaider. Eu fui testemunha do seu processo de elaboração. Primeiro, manuscreveu algumas histórias. Depois, convenceu-se de que a coisa poderia resultar melhor desde que passada a computador, e assim fez. Acrescentou-lhe novos títulos. Reorganizou-os e publicou-os no blogue que deu o nome ao livro. A isto chama-se ter capacidade, organização, força de vontade, criatividade e modernidade.
Para quem o conhece, nada disto é novidade. João Silva assume em tudo o que faz a atitude exigente, rigorosa e estrutural do artista, que sempre foi e continua a ser, como comprova este seu livro. No seu trabalho de repór­ter fotográfico na CGTP-IN, que me lembre, nunca falhou um serviço, e em todos eles conseguia um ou vários "bonecos" de se lhe tirar o chapéu. Nem que, para isso, tivesse de subir até quintos andares sem elevador ou trepar a candeeiros de iluminação das ruas e avenidas onde a CGTP-IN se manifestas­se. Punha neste trabalho o mesmo empenho e fervor que, sabemos, aplicou no seu labor cinematográfico com ilustres realizadores como Jorge Brum do Canto, Ettore Scola, entre muitos outros. Mas não se preocupava apenas em fazer bem, preocupava-se também com a qualidade do produto final e com a sua possível repercussão. Foi por isso que, por exemplo, desenvolveu uma autêntica cruzada para que se salvasse, através de microfilmagem, o espólio de imagem da confederação.
Pessoas destas engrandecem as organizações com que colaboram. Com Rocha Chenaider, autor e editor ficarão quites.

Hermínio Fernandes,
Ex-coordenador do Departamento
de Informação/CGTP-IN

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

JOÃO SILVA I

Porque o tempo urge e a promessa está feita fica um de vários testemunhos, que publicarei,
recolhidos do Livro Rocha Chenaider:

HOMEM DA LIBERDADE E DO SINDICALISMO



A entrada do João Silva na CGTP-IN, em Novembro de 1979, munido da sua inseparável "máquina de fazer bonecos", significou um sopro de vitalidade e cores novas no Alavanca, que emanavam da sua personalidade, do seu saber, da sua experiência de vida vivida.
Viril, nas suas 63 primaveras, João Silva, pela sua atitude e postura positivas perante a vida, pela capacidade de brincar falando sério e de seduzir, foi ensi¬nando a todos que com ele trabalhavam ou conviviam em espaço de trabalho, como se pode construir e guardar o "segredo" da juventude.
O João foi capaz de pegar no trabalho dos seus antecessores - que eram homens criativos e construtores do Alavanca como importante órgão de in¬formação sindical em contexto de revolução e de resistência à contra-revolu-ção - dignificou-o pela continuidade garantida, pela revitalização conseguida através das expressões novas, fruto do seu olhar específico sobre os seres humanos, as suas práticas e formas de agir.
A sua permanente jovialidade, a inquietude, a destreza na captação das melhores e mais expressivas imagens dos muitos acontecimentos da vida sindical, mas também, a sua preocupação em deixar a memória fotográfica desses momentos, de que foi construtor, foram fazendo dele uma referência insubstituível na vida da CGTP-IN.
Conhecendo, pelo que já havia vivido individual e colectivamente, o valor das causas dos trabalhadores, da liberdade e da democracia, abraçou o projecto sindical da CGTP-IN, identificou-se com toda a naturalidade nele, integrou-se no colectivo e nas suas formas de acção. Por isso foi vivendo com tanto inte-resse e sensibilidade cada manifestação, cada debate, plenário, conferência ou congresso, tornando-se participante obrigatório de todos eles.
No seu espaço de trabalho houve sempre algo para criar. Foi, de facto, o João Silva que deu um cunho organizativo mais estruturado ao arquivo foto¬gráfico da CGTP-IN, e é graças a esse seu trabalho que dispomos hoje de um repositório histórico de inestimável valor para a vida sindical.
Como repórter fotográfico com carteira profissional de jornalista, João Silva cobriu muitas centenas de acontecimentos sindicais num trabalho em que caldeava o sentido operário do dever profissional com uma apurada concep¬ção artística da fotografia, "vício" certamente alimentado pelas suas aventu¬ras de ser humano curioso, perante as mais diversas expressões de vida e de comportamentos e, também, pela sua experiência de assistente de imagem e profissional de múltiplas actividades na produção cinematográfica.
Ao meter mãos-à-obra para transportar para a escrita as suas fabulosas histórias, João Silva sossegou todos aqueles que, sendo seus privilegiados ouvintes, entendiam ser uma perda irreparável as suas narrativas não pode¬rem chegar a muito mais gente.
Maior surpresa é o facto de, nesta sempre difícil transposição do oral para o escrito, nada se ter perdido em termos da imagem do real e da vivacidade do discurso, o que revela mais uma qualidade do João que, até agora, estava escondida.
No percurso que vai das histórias de Lisboa aos olhares deliciosos sobre pedaços da vida africana de Angola e Moçambique, dos episódios pessoais às recordações da prisão, da tropa e do cinema, e ainda, na expressão do seu pensamento político, encontramos relatos reais que reflectem o amor à liber¬dade, a cultura e o sentido ético da vida que nos habituámos a reconhecer ao João Silva.
O 25 de Abril devolveu ao João Silva a Liberdade por que lutou de forma so¬lidária ao longo da sua vida. Conta ele que estava no Andulo, Angola, quando soube do que se passava então em Lisboa e diz-nos "Não chorara na véspera à noite, mas chorei naquela manhã".
Ao lermos as histórias do João sentimo-nos reconduzidos à situação de crianças deslumbradas, tal é a originalidade, o sentido de humor e, sobretu¬do, o afecto e o humanismo, que nelas perpassam.
João, todos nós, teus amigos e companheiros de tantas vivências no dia-a-dia do sindicalismo, das relações humanas, intervenção e luta social que ele significa, nos sentimos em dívida para contigo face aos ensinamentos imensos que nos vens oferecendo e vais continuar a oferecer. Havemos de ter a arte e o engenho necessários, a capacidade de dedicação às causas em que estamos, a alegria e confiança no futuro, suficientes para te irmos retribuindo.
Sabemos também que essa vai ser a atitude daqueles que te conhecerem, pela primeira vez, através da leitura deste teu belo livro.


Manuel Carvalho da Silva
Rocha Chenaider

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

JOÃO (ANTÓNIO) SILVA

Pique para aumentar
"Nasceu a 7 de Abril de 1916,em Lisboa, nos confins dopopular bairro lisboeta de Alfama.
Começou a trabalhar aos 12 anos, como escriturário. Aos 17 anos troca o escritório pelos estúdios de cinema da Tobis. A sua ligação à sétima arte manteve-se até aos 49 anos, com duas interrupções forçadas. A primeira deu-se logo em 1934, ano da sua admissão na Tóbis, tendo como causa directa a sua participação na Revolta do 18 de Janeiro. O arrojo custou-lhe dois anos de degredo nos Açores. A segunda, por um período mais curto, veio na sequência do funeral de Bento de Jesus Caraça. João Silva estava a filmar a manifestação de democratas que a cerimónia do funeral constituiu, quando a polícia lhe arrancou o filme da máquina e enviou o seu autor, uma vez mais, para a prisão.

No cinema, João Silva foi sucessivamente claquette-boy, assistente de operador e operador, tendo chegado a ser assistente do realizador italiano Ettore Scola, no filme Perdido em África, rodado no deserto de Moçâmedes. Entre outros, trabalhou com os seguintes realizadores: Cottinelli Telmo, Chianca de Garcia, Jorge Brum do Canto, Arthur Duarte, António Lopes Ribeiro, Francisco Ribeiro, Alexandre Onuchi, Leitão de Barros, Perdigão Queiroga e Henrique Campos. O seu nome figura na ficha técnica de filmes como Canção de Lisboa, Bocage, Aldeia da Roupa Branca, João Ratão, Pai Tirano, O Leão da Estrela, Pátio das Cantigas, Fátima–Terra de Fé, Um Homem às Direitas, Ladrão Precisa-se, A Morgadinha dos Canaviais, Camões, Fado, Vendaval Maravilhoso, Filho do Homem do Ribatejo, Kill or be killed (fita americana), Cantiga da Rua e do já referido Perdido em África, de Ettore Scola, e do filme francês Singrid.

Cineclubista activo, João Silva pertenceu ao Círculo de Cinema, que acabou por ser encerrado pela Pide, e os seus membros mais destacados mandados para Caxias.

Em Janeiro de 1950, João Silva demanda terras de Angola, onde se dedica ao documentário, designadamente ao serviço da Telecine-Angola, e garante, durante vários anos, o Jornal de Actualidades.

Depois da independência de Angola, é convidado pela Televisão da República Popular de Angola para chefiar os serviços de cinema. Aceita o convite, mas cedo abdica da função de chefia, preferindo voltar para trás das câmaras.
Regressa a Portugal em Agosto de 1979, sendo desde esse ano repórter fotográfico no departamento de informação CGTP-IN."

Posto isto que é muito meritório, falemos dos defeitos: Imaterialista incorrigível, solidário incondicional, narrador insuperável, modesto que até chateia, blogueiro invejável, não abre a boca para pedir e...porra:
Ainda diz que faço o favor de ser seu amigo!
Quem lhe desse com um valente abração em cima é que fazia bem


TRAZ OUTRO AMIGO TAMBÉM - Jose Afonso

segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Saúde.


Congratulo-me com a medida, todas as que sejam tomadas para colmatar a carência da prestação dos cuidados de saúde constitucionalmente prestados,

[Artigo 64.º(Saúde)1. Todos têm direito à protecção da saúde e o dever de a defender e promover.2. O direito à protecção da saúde é realizado:a) Através de um serviço nacional de saúde universal e geral e, tendo em conta as condições económicas e sociais dos cidadãos, tendencialmente gratuito]

são bem vindas.

Interrogo-me: não temos capacidade para formar mais médicos, ou não temos candidatos à altura das exigências das faculdades de medicina com perfil?

É sabido que muitas famílias recorrem a Espanha para que os seus filhotes, excluídos do ensino médico em Portugal, realizem os seus anseios; por outro lado o nosso sistema de ensino investe em cursos que, sabemos de antemão, não terão saída.

Ah, como eu gostaria de compreender coisas aparentemente tão simples.



Saúde (ao vivo) - Pedro Mariano

quinta-feira, 25 de setembro de 2008

mas o que é que o lête tem a vêri cu as têtas?

Comissão Europeia vai proibir produtos para crianças da China
"A União Europeia vai impor um embargo total aos produtos para crianças provenientes da China considerados como produtos de risco, na sequência do escândalo do leite contaminado chinês, anunciou esta quinta-feira a Comissão Europeia."

Estamos perante uma sansão, né? Ou, "és feio não brinco mais contigo".
É uma lógica do caraças! Bem gostaria de a ver aplicada aos óleos adulterados, provenientes de Espanha, ou ao vinho nacional, a martelo.

Na verdade quatro crianças, até ao momento, já não é pouco; cheguem-lhes sanções a sério e já agora que tal falar de brinquedos e brincadeiras: que tal menos restrições à produção de leite? E que tal criar excedentes para os enviar prós Biafras e Somálias?

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Coro do cornudos - Luis Pacheco por Mário Viegas

Coro dos cornudos - Mario Viegas

Coro de escárnio e lamentação dos cornudos em volta de S.Pedro
Coplas dedicadas às fogosas e vampirescas mulheres daBeira,de quem já Abel Botelho disse o que disse.
Monólogo do primeiro cornudo:
Acordei um triste dia
Com uns cornos bem bonitos
E perguntei à Maria
Porque me pôs os palitos
Jurou por alma da mãe
(Com mil tretas de mulher)
Que era mentira
Tambem,ainda me custava a crer
Fiquei de olho espevitado
Que calado é o mehor
E para não re-ser enganado
Redobrei gozos de amor
Tais canseiras dei ao físico
Tal ardor pus nos abraços
Que caí morto de tísico
Com o sexo em pedaços
Já esperava por isto a magana?
Já previra o que se deu?
Do Além via-a na cama
Com um tipo pior que eu
Vi-o dar ao rabo a valer
Fornicando a preceito
Sabia daquele mistério
Que puxa muito do peito
Foi a hora de me eu rir
Que a vingança tem seus quês
O mais certo é para aqui vir
Ainda antes que passe um mês
Arranjei um bom lugar
Na pensão de Mestre Pedro
Onde todos vão parar
Embora com muito medo
Não passava de uma semana
O meu dito estava escrito
Vítima daquela magana
Pobre tísico,tadito
Dueto dos dois cornudos:
Agora já somos dois
A espreitar de cá de cima
Calados como dois bois
Vendo o que passa na vida
Meteu na cama mais gente
Um,dois,três logo a seguir
Não há piça que a contente
É tudo o que tiver de vir
São Pedro,indignado,pragueja:
É demais,arre diabo-berra S.Pedro,sandeu-
E mortos por dar ao rabo,lá vêm eles p'ró ceu...
Coro,pianíssimo,lirismo nas vozes:
Quem morre como um anjinho...
Quem morre por muito amar...
Coro,agora narrativo ou explicativo:
Já formamos um ranchinho,de cá de cima a espreitar
Aparte do autor das coplas:-coitadinhos
Passam meses,passa tempo e a bela não se consola
Já somos um regimento como esses que vão para a Angola
Fazemos apostas lindas sempre que vem cara nova
Cálculos,medidas infindas,como ela terá a cova!
Há quem diga que por si já não lhe tocou o fundo
Outros juram que era assim do tamanho deste mundo
Parecia uma piscina!-diz um do lado,espantado-
Nunca vi uma menina num estado tão desgraçado
(Aparte do autor,antigo militante das esquerdas baixas)
Num estado tão desgraçado,parece-me ouvir o povo
Chorando seu triste fado nas garras do Estado Novo
O ultimo que cegou cá morreu que nem um patego
Afogado e era mar nos abismos daquele pêgo
O coro dos cornudos acompanhado por S.Pedro em
surdina,entoa a moralidade,após ter limpado as últimas
lagrimetas e suspirado como só os cornudos sabem:ahh!
Mulher não queiras sabida
Nem com vício desusado
Que podes perder a vida
Na estafa de dar ao rabo
Escolhe donzela discreta
Com os três no seu lugar
Examina-lhe bem a greta
Não te vá ela enganar
E depois de lhe veres o bicho
E as mamadeiras que tem
A funcionar a capricho
Já sabes se te convem
Mulher calma,é estima-la
Como a santa no altar
Cabra doida,é rifa-la
Que não venhas cá parar
Este conselho te dão
E não te levam dinheiro
Os cornudos que aqui estão
Com São Pedro hospitaleiro
Invejosos,quase todos
Dos cornos que o mundo guarda
Fazem mais um bocado de lamentação
(Nota do autor-quase,porque,entretanto alguns brincavam uns com os
outros.Rabolices...
Mas se fornicas a rodos tua vida aqui não tarda
Recomeça a moralidade,estilo 'estão verdes,não prestam'
Alguns bêbedos,cornudos despeitados ou
amargurados,vozes pastosas (deve ler-se vinho...velhinho)
Melhor que a mulher é o vinho
Que faz esquecer a mulher
Que faz do amor já velhinho
Ressurgir de novo o prazer
Finale muito católico
Assim termina o lamento
Pois recordar é sofrer
A mãe fode
É bom sustento
E por nós reza o pater
Luiz Pacheco,num dia em que se achou mais pachorrento.

terça-feira, 23 de setembro de 2008

PEIXEIRADA


Farsa trágico-cómica.
Peça em muitos actos (ainda não se sabe quantos)
Personagens:
Isabel Soares,
chefe de gabinete do vice-presidente da Câmara de Lisboa,
ex-presidente da Gebalis, empresa municipal que gere a habitação social de Lisboa.
dr. José Bastos
director do departamento de apoio aos órgãos do município,
tenta comprar casa da câmara em boas condições (a defenir o que são boas condições).
Ana Sara Brito,
actual vereadora da Habitação e Acção Social,
ex-Presidente de Freguesias
António Costa
Chefe de autarquia, sub-chefe de maioria nacional
Comentador telegénico
Ex-corredor da modalidade Porsch vs Burro
Santana Lopes:
Ex-primeiro ministro.
Presidente da CML
Presidente de um partido, quase completamente.
irá também ser constituído arguido
Helena Lopes da Costa.
A actual deputada do quase comletamente.
constituída arguida num processo de alegado favorecimento na atribuição de habitações
Miguel Almeida,
também deputado do tal partido
também constituído arguido
Manuela Ferreira Leite,
Presidente do completamente partido,
testemunha de um dos arguidos no caso,
Margarida Sousa Uva,
mulher de presidente emigrado
testemunha arrolada.
Miguel Relvas
misteriosa figura
Marco Almeida,
vice-presidente da autarquia Sintrense.
Sinopse:
Zangam-se as comadres e não se descobrem as verdades, talqualmente.
Helena é acossada arrastando consigo para a rua, enlameada, das amarguras: Pedro, e Miguel.
Ficará isto assim? Não! Põe a boca no trombone e… das brumas surge...
Isabel, que tem uma casa atribuída pela autarquia há 18 anos, já não vive nela; na casa está agora o seu filho. Isabel tenta adquirir a casa, a um preço abaixo do valor de mercado. O processo acaba por ser aprovado, a data da escritura marcada, mas... o processo esbarrara na vereadora Helena, que tinha o pelouro da Habitação Social, e que acaba por remeter o assunto, juntamente com um outro – o do dr. Bastos -, para o gabinete do, na altura, presidente Santana.
Entram em cena com sus trajes andaluces, e peruquerias: Manela, Pedro e muitos outros…
O resto são tretas?


tourada - Fernando Tordo

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Tu me quieres blanca

Tu me Quieres Blanca - João Villaret

TU ME QUIERES alba,
Me quieres de espumas,
Me quieres de nácar.
Que sea azucena
Sobre todas, casta.
De perfume tenue.
Corola cerrada

Ni un rayo de luna
Filtrado me haya.
Ni una Margarita
Se diga mi hermana.
Tú me quieres nívea,
Tú me quieres blanca,
Tú me quieres alba.

Tú que hubiste todas
Las copas a mano,
De frutos y mieles
Los labios morados.
Tú que en el banquete
Cubierto de pámpanos
Dejaste las carnes
Festejando a Baco.
Tú que en los jardines
Negros del Engaño
Vestido de rojo
Corriste al Estrago.

Tú que el esqueleto
Conservas intacto
No sé todavia
Por cuáles milagros,
Me pretendes blanca
(Dios te lo perdone),
Me pretendes casta
(Dios te lo perdone),
¡Me pretendes alba!

Huye hacia los bosques,
Vete a la montaña;
Límpiate la boca;
Vive en las cabañas;
Toca con las manos
La tierra mojada;
Alimenta el cuerpo
Con raíz amarga;
Bebe de las rocas;
Duerme sobre escarcha;
Renueva tejidos
Con salitre y agua;
Habla con los pájaros
Y lévate al alba.
Y cuando las carnes
Te sean tornadas,
Y cuando hayas puesto
En ellas el alma
Que por las alcobas
Se quedó enredada,
Entonces, buen hombre,
Preténdeme blanca,
Preténdeme nívea,
Preténdeme casta.


E já agora, mais casta e mais fiel... ao texto Perdi-o mas encontrei este.



Get this widget | Track details | eSnips Social DNA

domingo, 21 de setembro de 2008

Vai à merda... senão vou eu.

Cruzou por mim, veio ter comigo, numa rua da Baixa

Cruzou por mim, veio ter comigo, numa rua da Baixa
Aquele homem mal vestido, pedinte por profissão que se lhe vê na cara,
Que simpatiza comigo e eu simpatizo com ele;
E reciprocamente, num gesto largo, transbordante, dei-lhe tudo quanto tinha
(Exceto, naturalmente, o que estava na algibeira onde trago mais dinheiro:
Não sou parvo nem romancista russo, aplicado,
E romantismo, sim, mas devagar...).
Sinto uma simpatia por essa gente toda,
Sobretudo quando não merece simpatia.
Sim, eu sou também vadio e pedinte,
E sou-o também por minha culpa.
Ser vadio e pedinte não é ser vadio e pedinte:
E' estar ao lado da escala social,
E' não ser adaptável às normas da vida,
'As normas reais ou sentimentais da vida -
Não ser Juiz do Supremo, empregado certo, prostituta,
Não ser pobre a valer, operário explorado,
Não ser doente de uma doença incurável,
Não ser sedento da justiça, ou capitão de cavalaria,
Não ser, enfim, aquelas pessoas sociais dos novelistas
Que se fartam de letras porque tem razão para chorar lagrimas,
E se revoltam contra a vida social porque tem razão para isso supor.

Não: tudo menos ter razão!
Tudo menos importar-se com a humanidade!
Tudo menos ceder ao humanitarismo!
De que serve uma sensação se ha uma razão exterior a ela?

Sim, ser vadio e pedinte, como eu sou,
Não é ser vadio e pedinte, o que é corrente:
E' ser isolado na alma, e isso é que é ser vadio,
E' ter que pedir aos dias que passem, e nos deixem, e isso é que é ser pedinte.

Tudo o mais é estúpido como um Dostoiewski ou um Gorki.
Tudo o mais é ter fome ou não ter o que vestir.
E, mesmo que isso aconteça, isso acontece a tanta gente
Que nem vale a pena ter pena da gente a quem isso acontece.

Sou vadio e pedinte a valer, isto é, no sentido translato,
E estou-me rebolando numa grande caridade por mim.

Coitado do Álvaro de Campos!
Tão isolado na vida! Tão deprimido nas sensações!
Coitado dele, enfiado na poltrona da sua melancolia!
Coitado dele, que com lagrimas (autenticas) nos olhos,
Deu hoje, num gesto largo, liberal e moscovita,
Tudo quanto tinha, na algibeira em que tinha olhos tristes por profissão

Coitado do Álvaro de Campos, com quem ninguém se importa!
Coitado dele que tem tanta pena de si mesmo!

E, sim, coitado dele!
Mais coitado dele que de muitos que são vadios e vadiam,
Que são pedintes e pedem,
Porque a alma humana é um abismo.

Eu é que sei. Coitado dele!
Que bom poder-me revoltar num comício dentro de minha alma!

Mas até nem parvo sou!
Nem tenho a defesa de poder ter opiniões sociais.
Não tenho, mesmo, defesa nenhuma: sou lúcido.

Não me queiram converter a convicção: sou lúcido!

Já disse: sou lúcido.
Nada de estéticas com coração: sou lúcido.
Merda! Sou lúcido.

Alvaro de Campos

sexta-feira, 19 de setembro de 2008

Barrocas IV


Menina esperando faz parar o tempo.

Surgiram por fim; direitos à aventura de muitas de umas férias promissoras, pulando degrau a degrau para alcançarem mais abaixo a vereda encravada entre morros e o vazio orlado por capim.
Deu-lhes o avanço necessário para não “levar uma corrida” e afoitou-se. O peito apertava-se, finalmente podia penetrar no mundo proibido, e se achava que o cenário correspondia às descrições, achava também que uma grande dose de exagero havia no que dizia respeito aos perigos narrados. Procurava reter cada pormenor, guardava a miscelânea de sensações que a assaltavam: cores, sons e cheiros; pela certa que ali não voltaria.
O caminho ao princípio largo e de acentuado declive, tornava-se mais plano e estreito.Reconheceu o começo da Tundavala, nome roubado pelos rapazes para se referirem à estreita garganta que rasgava o morro que como um rio começava estreita e, serpenteando, se ia alargando e afundando. O caminho estreitava cada vez mais e ela cada vez mais se cozia à parede do morro, pernas tremendo. De repente estacou. O caminho, cada vez mais estreito, desaparecia numa curva apertada, como que suspenso no ar. Sentou-se, sentido o coração crescer no peito, olhou para trás e reprimiu as lágrimas juntando coragem para fazer o caminho de volta.
Algum tempo passou porque sentiu o sol queimar-lhe o corpo. Tomou coragem, levantou-se, deu dois passos de volta e quando pressentiu um movimento na suas costas; voltou-se aterrorizada e… viu o Pirolito correndo na sua direcção. O rosto iluminou-se-lhe de alegria, o canito endiabrado atirava-se-lhe às pernas, ladrava aflito, fugia por onde tinha vindo e voltava ao mesmo. Percebeu que queria que o seguisse. Venceu a curva temida coladinha à parede do morro, juntou forças para ultrapassar uns degraus escavados na terra, observada pelo Pirolito como que a incentivá-la, e viu-o partir de novo correndo.
-Pirolito, gritou, anda cá já –mas ele nada.
-Pirolito!!!
Pareceu-lhe ouvir gritarem: -Ajuda-me… Pôs o ouvido à escuta: -Ajuda-me, ajuda-me… Correu caminho abaixo sem querer saber se era largo ou estreito, deparou com Alfredo, suspenso sobre a ravina,, agarrado ao capim, o Pirolito mordendo-lhe os cabelos. Correu para eles, sentou-se no chão, deu-lhe uma mão e puxou, puxou…

O tempo, sabe ela hoje, não pára.


Marmelada - Duo Ouro Negro

terça-feira, 16 de setembro de 2008

Assim vai o mundo

Menezes quer debate com Marcelo
Pois bem, é justo. E já agora eu também quero um... com Flor Pedroso.

Menezes diz que Marcelo "atirou o poder pela varanda" quando foi líder.
É grave! Toda a gente sabe que o seu apartamento não tem varandas.

"todos aqueles que achem que têm ideias e propostas, devem veiculá-las".
E os que não as têm também, o sol quando nasce é para todos.

Mendes lança dia 25, em Lisboa, o livro Mudar de Vida.
Onde provávelmente irá anunciar o pedido de aposentação.

E já agora, um momento de má disposição:

domingo, 14 de setembro de 2008

Aguadeiro

click para aumentar



08 Faixa 8.wma -

Truncado

(...) Quando eu morrer e for chegando ao cemitério, Acima da rampa,
Mandem um coveiro sério
Verificar, campa por campa
(Mas é batendo devagarinho
Só três pancadas em cada tampa,
E um só coveiro seguro chega),
Se os mortos têm licor de ausência
(Como nas pipas de uma adega
Se bate o tampo, a ver o vinho):
Se os mortos têm licor de ausência
Para bebermos de cova a cova,
Naturalmente, como quem prova
Da lavra da própria paciência. (...)
Vitorino Nemésio

Outro Testamento (poema complet0 )


Save Me.wma - Aimee Mann

You look like a perfect fit
For a girl in need of a tourniquet

But can you save me
Come on and save me
If you could save me
From the ranks of the freaks
Who suspect they could never love anyone

'Cause I can tell
You know what it's like
The long farewell of the hunger strike

But can you save me
Come on and save me
If you could save me
From the ranks of the freaks
Who suspect they could never love anyone

You struck me dumb like radium
Like Peter Pan or Superman

You will come to save me
C'mon and save me
If you could save me
From the ranks of the freaks
Who suspect they could never love anyone
'Cept the freaks
Who suspect they could never love anyone
But the freaks
Who suspect they could never love anyone

C'mon and save me
Why don't you save me
If you could save me
From the ranks of the freaks
Who suspect they could never love anyone

Except the freaks
Who suspect they could never love anyone
Except the freaks who could never love anyone

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

Barrocas III


Menina escorraçada é pior que gaivota em terra.

Olho seco viu-os afastarem-se com a jura quebrada. Por uns momentos sentiu prazer em ver o coxear de Alfredo mas a recordação do seu braço sobre os seus ombros enquanto partilhavam a leitura do Kit Carson, fê-la sentir miserável. Eles afastando-se e ela mais miserável, sem saber se era do abandono se era do raio do braço.
Decidiu-se; apanhou as saias e torneou em corrida o campo da bola, não ligou ao –Xi minina, onde vais a corêr’assim? – lançado por Dona Mariquinhas, quando lhe atravessou o quintal ganhando vantagem quer na distancia, quer à perna marota de Alfredo; continuou a corrida desenfreada e só abrandou o paço quando avistou a estrada do Cacuaco. Dissimulou-se entre os montes de entulho e algum lixo e dispôs-se a esperar; um olho na orla de cubatas do outro lado da estrada, outro nos degraus ciclópicos que supostamente deveriam atenuar os efeitos das próximas chuvadas, -mais tarde se veriam os resultados de tamanha engenharia.
Para além dos degraus os morros estendiam-se em barrocas esculpidas pela água, qual paisagem lunar, para por fim se espraiarem num extenso mar de areia que morria aos pés do porto.
Lá de cima sentia-se no céu contemplando as cicatrizes rompidas na terra vermelha como de carne se tratasse, nas veredas que se perdiam morro abaixo perdiam-se os pensamentos; em cada uma revivia as histórias contadas pelos seus heróis em tardes mornas, às quais acrescentarei o devido ponto, neste conto. O ritual sagrado era marcado pela permanente lata de gasóleo fervendo no meio da fogueira, pelas folhas de jornal enroladas a preceito, ou cigarros, cuidadosamente furtados ao Sr. Silva, circulando de mão em mão. Cada troféu submetido à mira certeira das fisgas ou de chumbos, merecia uma descrição pormenorizada sobre o avistamento quase sempre longínquo, a aproximação pacientemente furtiva, o visar frio, o impacto certeiro, a trajectória da queda, e finalmente a recolha da peça onde Pirolito assumia recorrentemente um papel relevante.
A tocaia estava montada, os manos tardavam a aparecer.


Monangambé - Rui Mingas

Zwei jahre! xaissa, carago


A minha Maria alembrou-me que ando para aqui há dois anos! Dois anos nisto é tão absurdo como duas horas ou uma até.

Descubro o prazer de me enrolar nesta marmelada por vezes interrompida, qual coito.



Brindo-te com esta hora porque, porque... hoje é quarta.


Happy birthday Mr. President. - Marilyn Monroe

HORA ABSURDA

O TEU SILÊNCIO é uma nau com tôdas as velas pandas...
Brandas, as brisas brincam nas flâmulas, teu sorriso...
E o teu sorriso no teu silêncio é as escadas e as andas
Com que me finjo mais alto e ao pé de qualquer paraiso...

Meu coração é uma ânfora que cai e que se parte...
O teu silêncio recolhe-o e guarda-o, partido, a um canto...
Minha idéia de ti é um cadáver que o mar traz à praia..., e entanto
Tu és a tela irreal em que erro em côr a minha arte...

Abre tôdas as portas e que o vento varra a idéia
Que temos de que um fumo perfuma de ócio os salões...
Minha alma é uma caverna enchida p'la maré cheia,
E a minha idéia de te sonhar uma caravana de histriões...

Chove ouro baço, mas não no lá-fora...É em mim...Sou a Hora,
E a Hora é de assombros e tôda ela escombros dela...
Na minha atenção há uma viúva pobre que nunca chora...
No meu céu interior nunca houve uma única estrela...

Hoje o céu é pesado como a idéia de nunca chegar a um pôrto...
A chuva miúda é vazia...A Hora sabe a ter sido...
Não haver qualquer coisa como leitos para as naus!...Absorto
Em se alhear de si, teu olhar é uma praga sem sentido...

Tôdas as minhas horas são feitas de jaspe negro,
Minhas ânsias tôdas talhadas num mármore que não há,
Não é alegria nem dor esta dor com que me alegro,
E a minha bondade inversa não é nem boa nem má...

Os feixes dos lictores abriram-se à beira dos caminhos...
Os pendões das vitórias medievais nem chegaram às cruzadas...
Puseram in-fólios úteis entre as pedras das barricadas...
E a erva cresceu nas vias férreas com viços daninhos...

Ah, como esta hora é velha!... E tôdas as naus partiram!
Na praia só um cabo morto e uns restos de vela falam
De longe, das horas do Sul, de onde os nossos sonhos tiram
Aquela angústia de sonhar mais que até para si calam...

O palácio está em ruínas... Dói ver no parque o abandono
Da fonte sem repuxo... Ninguém ergue o olhar da estrada
E sente saudade de si ante aquêle lugar-outono...
Esta paisagem é um manuscrito com a frase mais bela cortada...

A doida partiu todos os candelabros glabros,
Sujou de humano o lago com cartas rasgadas, muitas...
E a minha alma é aquela luz que não mais haverá nos candelabros...
E que querem ao lago aziago minhas ânsias, brisas fortuitas?...

Por que me aflijo e me enfermo?...Deitam-se nuas ao luar
Tôdas as ninfas... Veio o sol e já tinham partido...
O teu silêncio que me embala é a idéia de naufragar,
E a idéia de a tua voz soar a lira dum Apolo fingido...

Já não há caudas de pavões tôdas olhos nos jardins de outrora...
As próprias sombras estão mais tristes...Ainda
Há rastros de vestes de aias (parece) no chão, e ainda chora
Um como que eco de passos pela alamêda que eis finda...

Todos os ocasos fundiram-se na minha alma...
As relvas de todos os prados foram frescas sob meus pés frios...
Secou em teu olhar a idéia de te julgares calma,
E eu ver isso em ti é um pôrto sem navios...

Ergueram-se a um tempo todos os remos...pelo ouro das searas
Passou uma saudade de não serem o mar...Em frente
Ao meu trono de alheamento há gestos com pedras raras...
Minha alma é uma lâmpada que se apagou e ainda está quente...

Ah, e o teu silêncio é um perfil de píncaro ao sol!
Tôdas as princesas sentiram o seio oprimido...
Da última janela do castelo só um girassol
Se vê, e o sonhar que há outros põe brumas no nosso sentido...

Sermos, e não sermos mais!... Ó leões nascidos na jaula!...
Repique de sinos para além, no Outro Vale... Perto?...
Arde o colégio e uma criança ficou fechada na aula...
Por que não há de ser o Norte e Sul?... O que está descoberto?...

E eu deliro... De repente pauso no que penso...Fito-te...
E o teu silêncio é uma cegueira minha...Fito-te e sonho...
Há coisas rubras e cobras no modo como medito-te,
E a tua idéia sabe à lembrança de um sabor de medonho...

Para que não ter por ti desprêzo? Por que não perdê-lo?...
Ah, deixa que eu te ignore...O teu silêncio é um leque ---
Um leque fechado, um leque que aberto seria tão belo, tão belo,
Mas mais belo é não o abrir, para que a Hora não peque...

Gelaram tôdas as mãos cruzadas sôbre todos os peitos....
Murcharam mais flôres do que as que havia no jardim...
O meu amar-te é uma catedral de silêncio eleitos,
E os meus sonhos uma escada sem princípio mas com fim...

Alguém vai entrar pela porta...Sente-se o ar sorrir...
Tecedeiras viúvas gozam as mortalhas de virgens que tecem...
Ah, o teu tédio é uma estátua de uma mulher que há de vir,
O perfume que os crisântemos teriam, se o tivessem...

É preciso destruir o propósito de tôdas as pontes,
Vestir de alheamento as paisagens de tôdas as terras,
Endireitar à fôrça a curva dos horizontes,
E gemer por ter de viver, como um ruído brusco de serras...

Há tão pouca gente que ame as paisagens que não existem!...
Saber que continuará a haver o mesmo mundo amanhã como nos desalegra!...
Que o meu ouvir o teu silêncio não seja nuvens que atristem
O teu sorriso, anjo exilado, e o teu tédio, auréola negra...

Suave, como ter mãe e irmãs, a tarde rica desce...
Não chove já, e o vasto céu é um grande sorriso imperfeito...
A minha consciência de ter consciência de ti é uma prece,
E o meu saber-te a sorrir é uma flor murcha a meu peito...

Ah, se fôssemos duas figuras num longínquo vitral!...
Ah, se fôssemos as duas côres de uma bandeira de glória!...
Estátua acéfala posta a um canto, poeirenta pia batismal,
Pendão de vencidos tendo escrito ao centro êste lema --- Vitória!

O que é que me tortura?... Se até a tua face calma
Só me enche de tédios e de ópios de ócios medonhos...
Não sei...Eu sou um doido que estranha a sua própria alma...
Eu fui amado em efígie num país para além dos sonhos...

Fernando Pessoa 4-7-1913

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

Variações sobre um corpo




Dá a surpresa de ser.
É alta, de um louro escuro.
Faz bem só pensar em ver
Seu corpo meio maduro.

Seus seios altos parecem
(Se ela estivesse deitada)
Dois montinhos que amanhecem
Sem ter que haver madrugada.

E a mão do seu braço branco
Assenta em palmo espalhado
Sobre a saliência do flanco
Do seu relevo tapado.

Apetece como um barco.
Tem qualquer coisa de gomo.
Meu Deus, quando é que eu embarco?
Ó fome, quando é que eu como?

Fernando Pessoa


O corpo e que paga - Antonio Variacoes

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Barrocas II

Quem não mordeu a maçã da índia parte desta vida sem conhecer um pouco do céu.

Não tardou muito que Alfredo aparecesse à varanda. Balançou o ramo onde se instalara, o suficiente para se fazer notada. –Hei! –ela nada– -Pauliiinha, tornou ele. Paulinha!!!! -já era coisa merecedora do: –Que é? –Viste o Dudu, o Lélé? –Foram pá Missão. –Cabrões! Oh Victor, os gajos foram pá Missão. –Cabrões, concordou logo o Victor. –E levaram as fisgas, picou ela.
Num foguete já estavam cá em baixo, e ela também. Espingarda de chumbos na mão Victor perseguido por Alfredo, capengando na sua perna marota, passo marcado pelos chumbos embolsados a chocalhar na caixa, eram por sua vez seguidos de perto por Paula. –Vai-t’embora. –Não vou nada, ora essa! Estacaram ameaçadores mas ela,também, ameaçadora disse: -Não foram pá Missão. –Então?! –Não foram. –Então, porra, merda, ENTÃO? –Só digo se puder ir. –Então? –Juras? –Juro. –E tu? –Juro, anda lá, porra… –Foram pás Barrocas. –Pás BARROCAS!? –dise um. –Pás Barrocas não vais disse o outro. –Mas… vocês juraram!!! –Mas não vais, isso é qu’era bom! (e poderia ter acrescentado: ponto final).
Quem jura… mais mente, mas o que ela em mente tinha…


Os Jovens Do Prenda - Lamento De Mãe

Afinal...

faltava contar as favas


domingo, 7 de setembro de 2008

depressões súbitas

A colega era nova. Queixava-se do horário, do quarto frio em cave escura e diminuto, da distância de casa, da enxaqueca… Convidei-a para um cafezinho que se prolongou entre silêncios embaraçosos e mais uns quantos lamentos. Lá dentro a rádio local emitia os sucessos do momento; de quando em quando metia informações úteis, tais como:


Segundo avança a Rádio Renascença, Leiria, Coimbra, Guarda, Viseu, Aveiro, Bragança, Vila Real, Porto, Braga e Viana do Castelo serão os distritos afectados, nas próximas horas, por chuva e ventos fortes, razão pela qual a Autoridade Nacional de Protecção Civil avançou já com os habituais conselhos de auto-protecção.



Perante tanto infortúnio e ainda para mais com tanto Gustavo e Ike a fazer estragos por aí, arrisquei:


-Com este tempo, se calhar, era bom ficares lá em minha casa…
-Obrigado, mas não ouvi falar no distrito de Setúbal!
-Pois não! Mas nunca se sabe como o tempo evolui, né?
-Obrigado na mesma, mas… estou em alerta vermelho.


Pegou na mala, levantou-se. Vi afastar-se num belo movimento de saias.


Não percebi nada. E elas é que se queixam de não nos perceberem!

Hurricane - Bob Dylan

Hurricane (Bob Dylan and Jacques Levy)


Pistol shots ring out in the barroom night
Enter Patty Valentine from the upper hall.
She sees the bartender in a pool of blood,
Cries out, "My God, they killed them all!"
Here comes the story of the Hurricane,
The man the authorities came to blame
For somethin' that he never done.
Put in a prison cell, but one time he could-a been
The champion of the world.

Three bodies lyin' there does Patty see
And another man named Bello, movin' around mysteriously.
"I didn't do it," he says, and he throws up his hands
"I was only robbin' the register, I hope you understand.
I saw them leavin'," he says, and he stops
"One of us had better call up the cops."
And so Patty calls the cops
And they arrive on the scene with their red lights flashin'
In the hot New Jersey night.

Meanwhile, far away in another part of town
Rubin Carter and a couple of friends are drivin' around.
Number one contender for the middleweight crown
Had no idea what kinda shit was about to go down
When a cop pulled him over to the side of the road
Just like the time before and the time before that.
In Paterson that's just the way things go.
If you're black you might as well not show up on the street
'Less you wanna draw the heat.

Alfred Bello had a partner and he had a rap for the cops.
Him and Arthur Dexter Bradley were just out prowlin' around
He said, "I saw two men runnin' out, they looked like middleweights
They jumped into a white car with out-of-state plates."
And Miss Patty Valentine just nodded her head.
Cop said, "Wait a minute, boys, this one's not dead"
So they took him to the infirmary
And though this man could hardly see
They told him that he could identify the guilty men.

Four in the mornin' and they haul Rubin in,
Take him to the hospital and they bring him upstairs.
The wounded man looks up through his one dyin' eye
Says, "Wha'd you bring him in here for? He ain't the guy!"
Yes, here's the story of the Hurricane,
The man the authorities came to blame
For somethin' that he never done.
Put in a prison cell, but one time he could-a been
The champion of the world.

Four months later, the ghettos are in flame,
Rubin's in South America, fightin' for his name
While Arthur Dexter Bradley's still in the robbery game
And the cops are puttin' the screws to him, lookin' for somebody to blame.
"Remember that murder that happened in a bar?"
"Remember you said you saw the getaway car?"
"You think you'd like to play ball with the law?"
"Think it might-a been that fighter that you saw runnin' that night?"
"Don't forget that you are white."

Arthur Dexter Bradley said, "I'm really not sure."
Cops said, "A poor boy like you could use a break
We got you for the motel job and we're talkin' to your friend Bello
Now you don't wanta have to go back to jail, be a nice fellow.
You'll be doin' society a favor.
That sonofabitch is brave and gettin' braver.
We want to put his ass in stir
We want to pin this triple murder on him
He ain't no Gentleman Jim."

Rubin could take a man out with just one punch
But he never did like to talk about it all that much.
It's my work, he'd say, and I do it for pay
And when it's over I'd just as soon go on my way
Up to some paradise
Where the trout streams flow and the air is nice
And ride a horse along a trail.
But then they took him to the jailhouse
Where they try to turn a man into a mouse.

All of Rubin's cards were marked in advance
The trial was a pig-circus, he never had a chance.
The judge made Rubin's witnesses drunkards from the slums
To the white folks who watched he was a revolutionary bum
And to the black folks he was just a crazy nigger.
No one doubted that he pulled the trigger.
And though they could not produce the gun,
The D.A. said he was the one who did the deed
And the all-white jury agreed.

Rubin Carter was falsely tried.
The crime was murder "one," guess who testified?
Bello and Bradley and they both baldly lied
And the newspapers, they all went along for the ride.
How can the life of such a man
Be in the palm of some fool's hand?
To see him obviously framed
Couldn't help but make me feel ashamed to live in a land

Where justice is a game.

Now all the criminals in their coats and their ties
Are free to drink martinis and watch the sun rise
While Rubin sits like Buddha in a ten-foot cell
An innocent man in a living hell.
That's the story of the Hurricane,
But it won't be over till they clear his name
And give him back the time he's done.
Put in a prison cell, but one time he could-a been
The champion of the world.

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

Barrocas I

Ah malandra! – atazanava ela – Olha-me para esses pés, olha-me para essa blusa, para essa saia!
Fora apanhada a esgueirar-se para a casa de banho. - E isto é que são horas?

Para trás ficara o primeiro dia de férias. Sorrateiramente, logo que a avó, bem cedo, saíra de casa, voou para fora dela a morder o pão com goiabada, sem tempo de afivelar as sandálias, ao encontro da felicidade. E a felicidade morava, logo ali, onde terminava o alcatrão e começavam as cubatas: a do Dudu e da irmã, a do Lelé e das irmãs, restos entalando a casa de dois andares do Victor e do Alfredo, filhos do Sr.Silva camionista, que assinalava nova fase de conquista dos muceques, por uma cidade em expansão emperdenida. Vagueou entre elas perseguida pelo Pirolito. Ah o Pirolito! -cauda enrolada entre as pernas, em permanente zig-zag, no seu branco sujo manchado de negros, primeiro e incondicional compincha de todas as brincadeiras. À segunda volta, Lélé saindo de sua “casa”, espreguiçando o corpo dourado, costelas para fora, num cristo mal amanhado, recebeu-a com um muchocho, facilmente ultrapassado com a partilha do pão que ela roía e ele fez desaparecer em duas penadas; a Dudu bastou a primeira conversa para se apresentar com a sua carapinha desalinhada, dentes a destoar em tanto preto; o milagre do pão que restava aconteceu, mas pela última vez. Passivamente assistiu à decisão da programação do dia: Barrocas do Porto, por unanimidade e sem aclamação. O coração apertou-se-lhe porque barrocas não seriam brincadeira para ela, sabia-o bem. Viu-os recolherem as fisgas, escolherem as melhores pedras, as redondinhas, e partirem. Os “Bicos de Lacre” e “Peitos Celeste”, Cucos até, que se cuidassem.

Trepou à macieira da índia, escolheu as madurinhas, seguindo-os, lá do alto, viu-os atravessar o campo da bola para atalharem nas cubatas mais além.


Serenata do adeus.mp3 - Duo Ouro Negro

terça-feira, 2 de setembro de 2008

Fado de amor, de amigo talvez

Espírito de leoa em outro corpo, lutando contra todos , é assim que a viam e a mordiam pelas costas. Não a viam lutando contra si mesma, presa a cadeias que a manietavam e diariamente rebentava, sabendo que outras nasceriam para se lhes ferrarem, mais que a carne, a alma.
Desenganem-se os que viam no seu rir ou no seu gesto desenvolto motivo de inveja; a sua língua certeira, e o olho em riste e de caras, que vos afrontavam e tanto temiam, a sua simples presença que vos fazia baixar a voz, ou até mudar de assunto não era uma ameaça porque incrivelmente desarmada andava ela.
Senhoras, aquele corpo de menina que tanto vos apoquentava, só aparentemente era frágil; saibam que os excessos correspondiam ao seu espírito. Quais excessos, muito amar? Amasse-se ela a si própria e ter-se-ia feito tão feliz como a tantos, acreditem, fez. Se quiserem falar de excessos, falem daqueles que se vos acumulam nas ancas, vos dilatam as barrigas e vos secam o ego.
Compreendo a vossa inveja mas não vos perdoo tanto mal querer, compreendo o mal dizer, afinal elogio vindo de quem vem, mas não vos perdoo a mentira e as suezes alusões. Na verdade até me merecem pena porque ela é a imagem que o vosso espelho não vos devolve. Não é?

Soubessem a dor que a assolava, quando via faltar a outros o que não lhe sobejava... como se ressentia do sofrimento de cão ou gato... como desejou ganhar asas e como se ateve, quase conformada, a um destino...

O mundo tão grande e a sua mão tão pequenina!
Fui dizer mal de ti a toda a gente,
Jurei, teimei, a todos convenci
Que eras um impostor que nada sente
E ainda hoje disse mal de ti!

Afirmei que me bates, que me oprimes,
Que és covarde, que és cínico e promíscuo!
Serias bem capaz dos maiores crimes,
Se te pagassem bem! Disse tudo isto!

Todos me acreditaram cegamente!
Nalguns olhos vi lágrimas luzindo!
Chorei, gritei, gemi cinicamente,
Mas cá dentro minha alma ia sorrindo!

Na boca das mulheres vi o lume
Do ódio, do rancor que eu acendi!
Menti a toda a gente por ciúme!
Só eu quero gostar, gostar de ti!

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Como os chapéus, há muitos… III

Centristas

Não falo daqueles que peroram no parlamento ainda que sentados à direita. Ainda que se diga que é no meio que está a virtude, de virtudes está o inferno cheio e na terra ainda sobram muitas... pelo menos é o que ecoa.
Falo sim dos que do Vale do Coa ao Zambeze, dos que do Minho a Timor, sem temor, alardeiam a necessidade da manutenção dos ecossistemas e quando começa a vir à baila a porra dos sistemas…


Da formiguinha ao lince da Malcata, do imbondeiro ao aloé ou à doce ervinha, né?, da porra do jacaré à merda da hiena ou à merda de guano, tudo é para manter, pronto aceito.

E eu? Quem me mantém? Quando é que me metem no (eco)sistema? Tá bem, sei que sou um predador de viúvas, se elegantes, e seria de teenagers se isso nã desse cadeia. Papo tudo que seja de boa carne e só se safam os legumes, as frutas e os verdes porque me fazem cair o cabelo, principalmente os verdes. Ah por falar em verdes e queda de cabelo, vem-me à memória Fulguroso Esperto. E porquê? Esperto até é senhor de farta cabeleira! Mas as associações de ideias, como as cerejas, fizeram-me chegar a D. Ferreira, XICo. Esse mesmo o dos minutos verdes e dos vulgos carvalhos, lat. Quercus, pois foi, este mesmo, o mentor de Fulguroso.
Fulguroso ,é de bater Palmas, e não só. Acérrimo defensor dos sistemas, com ele não há carvalho que vá abaixo ou barragem que vá acima, não há aeroportos, pontes e TVG’s, sem estudos de impacto ambiental, , ou impacte, feito por empresa idónea e por eles recomendada; nada avança sem queixa para Bruxelas; co-incinerações ou aterros sanitários… isso é qu’era bom, a ver vamos quem fez o projecto.


Bom a conversa vai longa, chega de gastar latim com os ecocêntricos, pois.


Fulguroso Esperto, nascido a 25 de Abril de 1974, ao dar um passo mais longo do que a perna permitia, foi vítima de forte distensão na virilha.


Vai amanhã, definitivamente, a enterrar e não lamento nada.

Mas quem sou eu para…




Os Demitidos - Jorge Palma

Estás demitido, obviamente demitido
tu nunca roubaste um beijo
e fazes pouco das emoções
és o espantalho dos amantes.
Estás demitido, obviamente demitido
evitas a competência
não reconheces o mérito
és um pilar da cepa torta

E assim vamos vivendo
na província dos obséquios
cedendo e pactuando enquanto der
filósofos sem arte, afugentamos o desejo
temos preguiça de viver

Estás demitido, obviamente demitido
subornas os próprios filhos
trocaste o tempo por máquinas
tu és um pai desnaturado.
Estás demitido, obviamente demitido
arrasas a obra alheia
às vezes usas pseudónimo
tu és um crítico de merda

E assim vamos vivendo...

Estás demitido, obviamente demitido
encostas-te às convergências
nunca investiste num ideal
tu sempre foste um demitido
tu foste sempre um demitido
já nasceste demitido!