sexta-feira, 30 de março de 2007

Cá o rapaz é assim IV





-Pagas-me um café?
Voltou-se e deu com um sorriso de olhos marcados por velhas e novas rugas, num rosto conhecido. Levantou-se de um salto ao reconhece-la, pelo sorriso retorcido meio terno meio trocista.
-Dina! Cum caneco!
Foi buscar um tamborete e fê-la sentar-se na mesa alta.
-Conta-me, fala-me de ti. Como resposta recebeu um poisar de mão no seu braço e um prolongado baixar de cabeça que revelou o despontar branco dos cabelos que espreitavam sob a última pintura.Com algum constrangimento afagou-lhe a mão e por fim ousou levantar-lha a cabeça que foi cedendo para revelar um olhar húmido e quente.
-E um café que tomas? Perguntou para quebrar o silêncio. Obteve um “carioca” cavo que lhe permitiu levantar-se. Do balcão observou-a: ar distante, queixo apoiado no polegar; achou-a mais magra, bela na sua tez morena, um moreno estranho que logo atribuiu à iluminação. Voltou para a mesa e colocou-lhe o café e um bolo de arroz á sua frente.
–Ainda te lembras! Disse agradecida.
-Dos teus gostos… muito mais do que julgas!
Dina atirou-se ao bolo com vontade mas não passou de meio, entregando-se ao beberricar do café.
O silêncio instalou-se de novo, Dina sem cerimónias serviu-se de um cigarro
-Não comes o resto? Disse levando a mão ao bolo. Como resposta viu, atónito, Dina levar a mão ao bolo e esfrangalha-lo e ao seu manifesto espanto dizer: -Pareceu-me estragado.
-Estragado, um bolo sem creme?
-Vamos dar uma volta por aí? Disse levantando-se e agarrando na mochila outrora preta.
Vamos, disse ele tirando-lha das mãos. Foram pelos corredores quase vazios e um pouco mais à frente detiveram-se na zona dos livros. Dina deambulando familiarmente pelos escaparates, ele seguindo-a a esmo. Dina aqui e acolá pegava, folheava e voltava a depositar livro após livro. Assim passaram de secção em secção, por fim Dina recolheu um “Corto Maltese” e refugiou-se num banco. Ele, por sua vez, sentou-se noutro ao lado e encostad
o a uma coluna observou-a. Dina ia lendo atenta sendo-lhe possível, de certa forma, acompanhar a história pela mudança de expressões de Dina; assim esteve deliciado até se aperceber que o livro ia descaindo sobre o magro peito enquanto Dina cerrava os olhos. Para ali ficou vendo-a, acabando por perceber, pelo suave movimento do livro, que adormecera. O seu tom de pele já não era o mesmo de outrora; apresentava-se mais amarelado, nada que uns dias de praia não corrigiriam, agora que o sol viera para ficar, pensou ele.

Focou a sua atenção na silhueta feminina que aparecera no extremo do corredor.
Elegante, bem arranjada, aproximava-se quase segura até se aperceber da sua presença. Sumiu-se por uma das secções reaparecendo pouco depois. Do limiar do corredor observou-o primeiro a ele e depois Dina; detectou-lhe uma reacção de desagrado ou reprovação enquanto caminhava na direcção deles. Ao passar por Dina olhou-a ostensivamente, parou mesmo, ficando a observa-la atentamente. Viu-a hesitar e sentar-se suavemente no extremo do banco onde Dina repousava. Dina abriu os olhos, sacudiu a cabeça, concentrou o olhar incrédula e, para seu espanto, viu as duas abraçarem-se. Assim ficaram por um momento, ao apartarem-se Dina tinha a mão livre tomada por umas mãos bem arranjadas. Irritou-o o riso em que as duas se envolveram, sentiu-se a mais, mais uma vez, levantou-se incomodado sem saber bem o que fazer, decidiu bater em retirada, mas não teve hipótese, Dina pressentiu a sua reacção, levantou-se dizendo alegremente:
-Guta, quero apresentar-te um velho amigo.
Aproximou-se, declinou o seu nome arrevesado, recebendo em troca uma mão, de costas para cima, meio morta, e um “encantada” que não correspondia, nada, nadinha, à sua expressão. Avaliou-lhe os anéis e afinfou-lhe com um aperto de mão que a fez fazer uma ligeira genuflexão, acompanhada de um risinho nervoso.
***
Garota de Ipanema

Olha que coisa mais linda
Mais cheia de graça
é ela menina, que vem e que passa
Num doce balanço a caminho do mar

Moça do corpo dourado
Do sol de Ipanema
O seu balançado é mais que um poema
é a coisa mais linda que já vi passar

Ai! Como estou tão sozinho
Ai! Como tudo é tão triste
Ai! A beleza que existe
A beleza que não é só minha
E também passa sozinha

Ai! Se ela soubesse que quando ela passa
O mundo interinho se enche de graça
E fica mais lindo por causa do amor
Só por causa do amor...

Vinicius de Moraes

terça-feira, 27 de março de 2007

Sócrates o maior deste curto século

Bonito serviço! O serviço público prestado pela RTP -Rádio Televisão PORTUGUESA- vincadamente referido como um jogo, uma brincadeira, dignifica quem e o quê?

Independentemente do estímulo de que possa servir o resultado desta dita brincadeira, para uma franja saudosista e veneradora de um ditador, servirá também de aviso à navegação dos políticos responsáveis pelo descrédito do regime democrático.

Lamento dizer, mas o assalto ao poder através de programas eleitorais não implementados, é tão infame como um golpe militar, talvez ainda mais, porque é torpe.

Reconhecer que não se está a cumprir o programa eleitoral por antecipadamente se desconhecer o estado da Nação é revelador de falta de capacidade para governar. No mínimo, nesta situação, o vencedor deveria preparar de imediato um novo sufrágio remetendo-se a GOVERNO DE TRANSIÇÃO, anunciando a verdadeira situação do país e as medidas necessárias para a resolver.

Sei que sou ingénuo, lorpa até, mas é isto que penso.

segunda-feira, 26 de março de 2007

Coisas boas

são para partilhar.

E as muito boas?

(de António Melenas - poesia e testemunhos)
(de Helena Isabel Ponce - emoção até mais não)
Deixem para lá as baboseiras que por ali abaixo vão ,
cliquem nas ligações, aqui, mesmo á mão

domingo, 25 de março de 2007

Cá o rapaz é assim III

Olhou para o relógio antes de o afivelar no pulso. Tinha bastante tempo a bicha, desculpem, a fila só se começaria a desfazer depois das dez. Hesitou* Exitou na eau-de-toillete, preteriu a Hugh Boss que lhe ofereceram lá na empresa, só pelo Boss obviamente estúpido, optou pela Chevalier D’Orsay que o distinguia dos aromas disseminados por qualquer centro comercial. Com a gravata decidiu-se de imediato pela de seda suíça, estampada em tons rosa velho e lilás foncé, com discretas inserções de miró; alguns achariam um pouco desadequado mas tinha criado um património de credibilidade que lhe permitia subtis desvios, diga-se de passagem, que eram prontamente objecto de tentativa de cópia do Araújo Collaço, sacana de advogado caneco. Por momentos, perdeu-se em pensamentos, à volta do Collaço, por quem nutria um ódio de estimação que vinha mantendo, deste os tempos de faculdade, nas velhas RIA’s. O sacana do MR-dum-caneco, como era conhecido, boa luta então lhe dava! Engraçado era como o bastardo, soubera fazer-se à vida, agora colado ao poder, sem muito se cmprometer. Viesse o governo que viesse, o “caneco” estava sempre na maior, e era isso exactamente que o tornava útil, quase imprescindível, lá na empresa. Despertou destes pensamentos e acabou de se arranjar: colocou os suspensórios, vestiu o casaco e deu uma ultima mirada ao espelho, aproveitando para ajeitar o cabelo.
Enquanto descia as escadas, pensou que deveria reforçar o programa no ginásio pois, ou muito se enganava ou estava a ficar menos tónico. Decidiu também que os sábados ficariam destinados ao ténis, o golf ficava reduzido aos domingos.
Chegado á sala de jantar, cumprimentou com um beijo na testa a mulher e jovialmente sem olhar para ela: -Bom dia Guta, dormiu bem?
Sentou-se e procedeu ao trivial pequeno almoço: Torrada com ligeiro doce + sumo de laranja + Jornal Económico. –Desculpa, disse ele levantando os olhos para a mulher quando se apercebeu que dizia qualquer coisa.
-Como quer fazer?
-Fazer, o quê, amor?
-Levamos os dois carros?
-Não querida, vou consigo no seu. O motorista leva o Volvo directamente para a assistência e nós podemos ir pela Marginal. Acha bem?
-Perfeito querido.

Saíram com o pequeno Audi 4 pelos portões de ferro forjado que se abriram automaticamente, ela sorriu ao leve apertar de joelho. Contornaram a o Forte da Cidadela, passaram pelo mercado, estação, Jumbo e só a partir daí o trânsito começou a fluir. Gustavo ligou o rádio,



Guta colocou os óculos de sol, reclinou ligeiramente o encosto, virou a cabeça para a janela recebendo o sol morno do meio da manhã.

No parque de estacionamento, declinou o amável convite para subir.
-Então o que vai fazer?
-Sinceramente… não sei, apetece-me fazer qualquer coisa de diferente.
-Não quer almoçar comigo?
-Obrigada querido, mas sei que os seus almoços são trabalho.
-De facto… Não tenho nada na agenda mas não me admirava se me encaixarem qualquer coisa à última da hora.
Trocaram de lugares, antes de fechar a porta, curvado Gustavo beijou-a suavemente nos lábios, apertou-lhe com o nó dos dedos a face, disse-lhe adeus sorrindo –Porte-se bem e dirigiu-se para os elevadores.

Guta subiu a rampa sentindo-se encadeada pela luz do dia.
Gustavo saiu no décimo primeiro piso, dirigiu-se para o seu gabinete respondendo aos cumprimentos, abriu a porta onde uma discreta chapa de cobre indicava:
Engº Gustavo Miranda de Azevedo
Director Geral

Foi até à secretária sem naquele dia reparar no verde de Monsanto nem no azul do Tejo.
Guta foi conduzindo pela cidade, desceu a Calçada de Campolide, passou pela Praça de Espanha, perdeu-se em pensamentos e viu-se na 2ª circular estranhamente perdida. Parou no parque de estacionamento exterior. Quando ali entrou, pela segunda vez, interrogou-se se estaria bem pois abominava Centros Comerciais. Eram quase 11:30.
*Hesitou - Emendado por Toix, fica aqui para minha vergonha.

sexta-feira, 23 de março de 2007

Cá o rapaz é assim II




… enquanto ajeitava o lenço no pescoço assobiando.

Passou pelo elevador com a porta rebentada mas compensado com as múltiplas grafitagens. Pensou lá para com ele – os chavalecos não podem ir longe, só pá veia é o que é – desceu os lances de escada evitando pisar o lixo acumulado que aumentava à medida que descia. Ao sair do prédio sacou dos persol, levou a mão ao bolso e verificou o dinheiro; apartou a nota de vinte que conquistara na véspera colocando-a no bolsito que o sinto protegia, e o resto – doze oiritos – enfiou-os no bolso de trás, que à peida ninguém lhe ia.

Atalhou direito à paragem e acelerou o passo para apanhar o autocarro; esticou a mão ainda de costas, e deu uma pequena corrida, a porta abriu-se olhou para o condutor e decidiu mandá-lo seguir com um desculpe. Foi até à pastelaria que ficava do outro lado, esperou calmamente pela atenção da empregada que esfregava o tampo de inox, quando ela se resolveu a um olhar de soslaio, empurrou com um dedo os óculos para a testa e sussurrou:
-Uma bica, baby.
A tal de baby, sacou por sua vez do sorriso monalisa, e perguntou-lhe, -Como? Ao que ele mirando-lhe o decote respondeu –Hum… cheiinha baby, cheiinha, e levou a mão ao bolso de trás. –Pag’á casa. Arqueou as sobrancelhas e a baby continuou, -É pela ajuda que deu com o desatino do outro dia. – Há, isso! São uns putos porreiros, não a chateiam mais, obrigado.
Pegou na bica e foi até uma mesa junto à janela para gozar o sol, pelo caminho arrebanhou os jornais do dia anterior; decidiu-se pelo Correio da Manhã para ver como paravam as modas, pois ouvira que tinha havido cegada no bairro ao lado. Beberricando e folheando acabou por desistir, não deu por qualquer notícia que se referisse à zona. Acendeu um cigarro e ignorou os movimentos da empregada que continuava a esfregadela na ponta do balcão mais próxima dele. Calculou o tempo decidindo que era melhor ir andando, ao sair levou mudo dois dedos em direcção a um possível chapéu e lá foi com o sentimento que tinha deixado um qualquer rasto atrás de si.

Não esperou muito na paragem, o autocarro parou sem ser preciso fazer sinal, cumprimentou o motorista ao entrar, passou pelo obliterador sem se deter e dirigiu-se para a porta de trás. Ao olhar que o condutor lhe deitou pelo espelho respondeu com um discreto acenar de mão que foi retribuído com um acenar de cabeça.


modelo do rapaz

em traje domingueiro

A viagem prosseguiu parando aqui e ali para troca de passageiros que se iam avolumando. Na avenida, em frente ao centro comercial o autocarro abrandou abrindo a porta pelo justo momento de ele saltar. Fê-lo com a elegância estudada, e assim foram às suas vidas.

A caminho do Centro Comercial foi programando a estratégia. Quase onze horas, ao passar pelo segurança decidiu começar por bater as professorinhas na livraria da Fnac. O sucesso era remoto mas o dia era longo e se alguma caísse sempre juntava o útil ao agradável.

in Astronomy Pictures


Vou falar-vos dum curioso personagem: Jeremias, o fora-da-lei
Descendente por linhas travessas do famigerado Zé do Telhado
Jeremias dedicou-se desde tenra idade ao fabrico da bomba caseira
Cuja eloquência sempre o deixou maravilhado
Para Jeremias nada se assemelha á magia da dinamite
A não ser talvez o rugir apaixonado das mais profundas entranhas da terra
Só quando as fachadas dos edificios públicos explodirem numa gargalhada
Será realmente pública a lei que as leis encerram
Há quem veja em Jeremias apenas mais uma vitima da sociedade
Muito embora ele tenha a esse respeito uma opinião bem particular
É que enquanto o criminoso tem uma certa tendência natural p'ra ser vitimado
Jeremias nunca encontrou razões p'ra se culpar
Porque nunca foi a ambição nem a vingança que o levou a desprezar a lei
E jamais lhe passou pela cabeça tentar alterar a constituição
Como um poeta ele desarranja o pesadelo p'ra lá dos limites legais
Foragido por amor ao que é belo e por vocação
Jeremias gosta do guarda roupa negro e dos mitos do fora-da-lei
Gosta do calor da aguardente e de se seguir remando contra a maré
Gosta da forma como os homens respeitáveis se engasgam quando falam dele
E da forma como as mulheres murmuram: o fora-da-lei
Gosta de tesouros e mapas sobretudo daqueles que o tempo mais mal tratou
Gosta de brincar com o destino e nem o próprio inferno o apavora
Não estando disposto a esperar que a humanidade venha alguma vez a ser melhor
Jeremias escolheu o seu lugar do lado de fora

quarta-feira, 21 de março de 2007




Um dia ele chegou tão diferente
do seu jeito sempre chegar
Olhou-a dum jeito muito mais quente
do que sempre costumava olhar
E não maldisse a vida tanto quanto
era seu jeito sempre falar
E nem a deixou só num canto,
para seu grande espanto convidou-a pra rodar

Então ela se fez bonita
como há muito tempo não queria ousar
Com seu vestido decotado
cheirando a guardado de tanto esperar
Depois os dois deram-se os braços
como há muito tempo não se usava dar
E cheios de ternura e graça
foram para a praia e começaram a se abraçar

E ali dançaram tanta dança
que a vizinhança toda despertou
E foi tanta felicidade
que toda a cidade enfim se iluminou
E foram tantos beijos loucos
Tantos gritos roucos como não se ouvia mais
Que todo mundo compreendeu
E o dia amanheceu
Em paz

Música: Vinicius de Moraes

Letra: Chico Buarque

Equinócio

Dia Mundial:
Do Sono
Da arvore

A primavera veio para ficar!
O calor desperta no sangue ardores,
Os dias em constante alongar.
Luz inimiga de clandestinos amores,
Afinal o que há para festejar?

segunda-feira, 19 de março de 2007

How'r Things

Com um pé em terra






outro no mar















mas por vezes no ar





há partir e chegar

com um acenar









uns olhares pela popa
























outros pela proa

















ou por onde calhar


















PARTE-SE A PENSAR NA CHEGADA

CHEGA-SE A PENSAR NA PARTIDA

sexta-feira, 16 de março de 2007

Não há direito

Nem todos os dias podem ser bons e quando é assim um homem tem de se fazer ao mar.
Fiquem numa boa que o Erecteu vai para uma fossa.
Três noites e dois dias dias de mar: caç'á vela, orça, não, não, arriba porra, arriba...
É uma chatice: o calor puxa à cervejinha fria e esta pede um pastelito de bacalhau, depois, a meio do dia, ter que mergulhar para ver se o casco está muito sujo, ao fim um tipo ter que arrumar a tralha toda antes de ir a terra só para comer um pêxito grelhado! É uma cansêra.
Desculpem lá qualquer coisinha mas lá terá que ser.




o mimo sabe bem, obrigado



"A felicidade é uma obra-prima: o menor erro falseia-a, a menor hesitação altera-a, a menor falta de delicadeza desfeia-a, a menor palermice embrutece-a..."
Marguerite Yourcenar, "Memórias de Adriano"


Tristeza não tem fim
Felicidade, sim

A felicidade é como a pluma
Que o vento vai levando pelo ar
Voa tão leve
Mas tem a vida breve
Precisa que haja vento sem parar

A felicidade do pobre parece
A grande ilusão do Carnaval
A gente trabalha o ano inteiro
Por um momento de sonho
Pra fazer a fantasia
De rei ou de pirata ou jardineira
E tudo se acabar na quarta feira

Tristeza não tem fim
Felicidade, sim

A felicidade é como a gota
De orvalho numa pétala de flor
Brilha tranquila
Depois de leve oscila
E cai como uma lágrima de amor

A minha felicidade está sonhando
Nos olhos da minha namorada
É como esta noite
Passando, passando
Em busca da madrugada
Falem baixo, por favor
Pra que ela acorde alegre como o dia
Oferecendo beijos de amor

Tristeza não tem fim
Felicidade, sim

Tom Jobin

quarta-feira, 14 de março de 2007

Erecteu à Brás

Bolachinha, mais uma vez desafiado, qualquer dia pareço um bacalhau.

Mas queres mesmo saber como é um dia na minha vida? Mas queres mesmo, mesmo, mesmo, mesmo, mesmo, saber? Ok, aqui vai...
Dos sete não há um igual ao outro, por isso vou escolher o sábado que é o que mais gosto, embora não sendo também todos iguais: não é véspera de dia de trabalho, é o princípio de fim-de-semana e o Erecteu gosta mais de começar do que acabar.

6h30: Acordo com a doce sensação de que há um longo e saboroso fim-de-semana. Poderei não fazer o que quiser!
6h33: uma mijinha e volto para a cama para fumar. Ligo a TV ponho os auscultadores e vejo notícias.
7h00: Ligo o compudador, vou fazer o pequeno-almoço, e como kuskando e comendo, simplesmente Bolachinha
7h15: Vou fazer um café expresso, assalta-me uma ideia e volto para escrever meia dúzia de frases no doc1, o café arrefece.
7h35: Vou fazer outro e já não me deixo enganar. Volto para o computador mas já não largo a chávena. Escrevo umas frases com a mão esquerda enquanto beberrico.
8h35: Já passou mais de uma hora! Vou largar a chávena e sigo directo para a casa de banho, para fazer o que melhor sei.
8h39: Feita a cagada, lavo cu e as mãos à maneira árabe, os dentes à maneira e enfio a roupa do dia anterior.
Qual banho ou barba! Porque hoje é sábado…
8h45: Volto ao computador, vejo se há comments, que sei não poder haver, vou ao mail , sou assaltado por um ataque de ansiedade, largo tudo e piro-me.
9h10: Entro no mercado e passeio pelas bancas cumprimentando quem me olha. Compro carne, pão, feijão verde, pimentos e acabo na banca da D. Ana que me aconselha o peixe que de melhor tem para grelhar, atendendo ao custo qualidade. Da sarda ao robalo vale tudo, ela é que sabe.
Aproveito para comprar o Expresso que eu já sei que não lerei um quarto sequer.
10h10: Volto para casa, deixo o avio na cozinha.
Chega o Custodio. Arranco para a reforma agrária. É dia de poda no pomar, sim que tenho um pomar constituído por uma laranjeira e um limoeiro. O Custódio poda e eu acarreto os ramos para o lixo. Aproveito os limões que distribuo DIScriminadamente pelos vizinhos.
11h30: Bebemos uma cerveja que o sol aperta.
12h00: A poda tá feita. Decido que a relva também vai de co, digo, vai de cana, agarro na máquina e atiro-me aos 24 m2 de relvado que nem um rambo atacando hoste comunista.
12:25: Vencedor e convencido da minha superioridade moral, chamo o puto para pôr a relva no lixo.
O puto resiste e eu cedo.
-Tá bem, vai acender o lume que eu vou ao lixo.
Ele cede.
-Tá beeeeem, eu vou, acendes tu o lume.
12h45: Lume aceso, pimentos a assar, panelas ao lume com água a aquecer,
13h00: Vou tomar um banho e acabo por fazer a barba.
13h15: Sinto-me seis horas mais novo.
Enfio batatas e feijão verde nas panelas. Sim em panelas diferentes que, se eu gosto de misturas, não é na cozinha.
Duas generosas douradas escaladas, untadinhas com uma marinada de alhos coentros, sal e azeite estão prontas para o sacrifício do fogo e redimirem os pecados do mundo em lume brando.
13:35: Escorridas as panelas, pelados os pimentos, as douradas acabam em lume forte.
13:45: Aberta uma garrafa de vinho tinto da Comporta e uma garrafa de trina laranja, começamos a comer.
14h30: Dou mais uma vez uso à DeLonghi, reforço a dose, encho um balão com CRF, acendo um purito e esparramo-me no sofá.
15:00: Hora de desporto. Ligo o canal 2, e puxo o saco cama.
16:00: Acordo. Já chega de desporto, vou aos blogs e concluo que deve andar toda a gente na galderice, não há comentários que se vejam.
Escrevo indisciplinadamente, kusko, vou ao google, ao goear.
18h00: Já! Hesito. Vou ou não vou dar uma volta?
Chateio o puto que resiste e não quer.
Não vou.
18h30: Pego no Expresso, leio um pouco. Dou pelo findar do melhor dia da semana.
18h55: Vou aviar a minha receita: Duas latinhas. Uma, FUMAR MATA a outra, Fumar preju…
É pra isto que um homem anda a pagar impostos?
Vou até ao rio e fico a ver o subir da noite.
Telefono para casa a desafiar o puto para ir jantar fora que resiste mas desiste.
20h00: Vamos jantar. Conversamos um pouco, picamo-nos um ao outro que é a nossa forma de dizermos que nos amamos.
21h05: Voltamos a casa.
-Vou sair com os amigos.
-Precisas de dinheiro?
-Ainda tenho.
-Não voltes tarde.
-Meia noite, se me atrasar telefono, já sei.
Ponho-me no meu bLUGAR
23h55: -Olá, chega o puto, tenho o último beijinho do dia, -Vou-me deitar.
Não fiques até tarde.
Que descaramento! Onde já se viu, isto?
… continuo blogando
2h00: JÁ!?
Vou-me deitar.
Porque hoje é sábado, comprei um violão para minha filha Susana, a fim de que ela aprenda dó maior e cante um dia, ao pé do leito de morte de seu pai, a valsa "Lágrimas de dor", de Pixinguinha – e seu pai possa assim cerrar para sempre os olhos entre prantos e galgar a eternidade ajudado pela mão negra e fraterna do grande valsista...Porque hoje é Sábado, desejarei ser de novo jovem e tremer, como outrora, à idéia de encontrar a mulher casada, de pés de açucena; desejarei ser jovem e olhar, como outrora, meus bícepes fortes diante do espelho...Porque hoje é Sábado, desejarei estar num trem indo de Oxford para Londres, e à passagem da estação de Reading lembrar-me de Oscar Wilde, a escrever na prisão que o homem mata tudo o que ele ama...Porque hoje é Sábado, desejarei estar de novo num botequim do Leblon, com meu amigo Rubem Braga, ambos negros de sol e com os cabelos, ai, sem brancores; desejarei ser de novo moreno de sol e de amores, eu e meu amigo Rubem Braga, pelas calçadas luminosas da praia atlântica, a pele salgada de mar e de saliva de mulher, ai...Porque hoje é Sábado, desejarei receber uma carta súbita, contendo sobre uma folha de papel de linho azul a marca em batom de uns grossos lábios femininos, e ver carimbado no timbre o nome Florença...Porque hoje é Sábado, desejarei que a lua nasça em castidade, e que eu a olhe no céu por longos momentos, e que ela me olhe também com seus grandes olhos brancos cheios de segredo…Porque hoje é Sábado, desejarei escrever novamente o poema sobre o dia de hoje, sentindo a antiga perplexidade diante da palavra escrita em poesia e como dantes, levantar-me com medo da coisa escrita e ir olhar-me ao espelho para ver se eu era eu mesmo...Porque hoje é Sábado, desejarei ouvir cantar minha mãe em velhas canções perdidas, quando a tarde deixava um alto silêncio na casa vazia de tudo que não fosse sua voz infantil...Porque hoje é Sábado, desejarei ser fiel, ser para sempre fiel; ser com o corpo, com o espírito, com o coração fiel à amiga, àquela que me traz no seu regaço desde as origens do tempo e que, com mãos de pluma, limpa de preocupações e angústia a minha fronte imensa e tormentosa...

segunda-feira, 12 de março de 2007

Por tudo e por nada



Eu que me comovo
Por tudo e por nada
Deixei-te parada
Na berma da estrada
Usei o teu corpo
Paguei o teu preço
Esqueci o teu nome
Limpei-me com o lenço
Olhei-te a cintura
De pé no alcatrão
Levantei-te as saias
Deitei-te no banco
Num bosque de faias
De mala na mão
Nem sequer falaste
Nem sequer beijaste
Nem sequer gemeste,
Mordeste, abraçaste
Quinhentos escudos
Foi o que disseste
Tinhas quinze anos
Dezasseis, dezassete
Cheiravas a mato
À sopa dos pobres
A infância sem quarto
A suor, a chiclete
Saíste do carro
Alisando a blusa
Espiei da janela
Rosto de aguarela
Coxa em semifusa
Soltei o travão
Voltei para casa
De chaves na mão
Sobrancelha em asa
Disse: fiz serão
Ao filho e à mulher
Repeti a fruta
Acabei a ceia
Larguei o talher
Estendi-me na cama
De ouvido à escuta
E perna cruzada
Que de olhos em chama
Só tinha na ideia
Teu corpo parado
Na berma da estrada
Eu que me comovo
Por tudo e por nada


Acrílicos Tania Leal

BOLERO DO CORONEL SENSÍVEL QUE FEZ AMOR EM MONSANTO

poema de Antóno Lobo Antunes

BOITEZULEIKA

sábado, 10 de março de 2007

Cá o rapaz é assim

Está pior que guardanapo de papel usado e amachucado.
Dói-lhe a cabeça da noitada e pelo que de si deu, para além do estabelecido e consensualmente convencionado.
Hesita mas acaba por se levantar. Atravessa o quarto vai até à kitchnet, aquece no microondas uma xícara do café que sobrara do dia anterior, liga a TV a que não presta a atenção, puxa dum Marlboro e senta-se à janela do quarto olhando nada.
O dia tá lindo, o sol sobeja caté met'inveja. Perdido em vagos pensamentos, dá por si a filosofar se um dia daqueles é ou não bom para a caça. Acaba por concluir que de caça não percebe nada. Deriva para a pesca e conclui que não, pois tem de ouvido, que a sombra na água espanta o peixe. Afinal actividades ao ar livre não são a sua especialidade; de captura de espécies não percebe patavina, tirando aquela a que amiúde se dedica nos centros comerciais, com técnicas apuradas em muitos anos de prática - tiro ao borracho. Para essa arte é preciso mais saber do que têm esses amadores domingueiros, de sequeiro ou de águas lusas.
As técnicas podem assemelhar-se: o engodo, a espera, o cerco ou o arrastar, mas para a sua arte há que dominar o canto e encanto à distância; é preciso o golpe de asa rasante, a abordagem subtil e o desconcertar para atacar com audácia temerária, mas acima de tudo há que ter calo e calma.
Quantas vezes não teve de enfrentar o insucesso? Aí, no infortúnio, é que se faz a diferença, se vê a classe do rapaz: retirada elegante e sorriso convincente impõe-se, pois fair-play não é só pá bola. Sobretudo nada de desatinos ou despeitados insultos entre dentes que cada peça que foge é uma lição a não esquecer e a juntar ao património acumulado para posterior tratamento de dados e correcção da acção.

Por fim esticou as pernas, entrelaçou as mãos atrás da nuca e estirou-se gozando um longo bocejo acompanhado de um som vagamente semelhante a loba com o cio. Levantou-se energicamente e dirigiu-se à pequena casa de banho. Passou água pela cara e pelo cabelo, escovou rapidamente os dentes e entregou-se por fim ao sagrado ritual de se barbear. Espalhou o foam pela cara, foi buscar a Wilkinson de três lâminas, mirou-a hesitando se as renovaria; decidiu que ainda não era altura de as trocar, esse prazer ficava adiado para posterior altura face ao agravamento do custo de vida. Colocou-se em frente ao espelho de pernas entreabertas em pose que adoptara do Saturday Night Fever. Em movimentos disco foi talhando e remirando-se ao espelho contornando lentamente o bigode e acertando as patilhas. Passou a máquina por água corrente e aspergiu a cara com água fria. Cheirou os sovacos e resolveu-se a levar mais longe a higiene, tendo o cuidado de não molhar a camisola interior. Dirigiu-se para a porta e antes de a fechar fez um exame rápido decidindo que deixara tudo em impecável ordem fechou a luz e a porta. Enfiou rapidamente as calças justas e pela cabeça a camisa que não chegara a desabotoar, enfiou a fralda dentro das calças, afivelou o largo cinto, calçou as botas que adorava: tacões em cunha., um pouco cambados, biqueira afiada e pespontos rematando a arte aplicada de sabor texano. Enfiou o colete que comprara baratíssimo a um marroquino armado em esperto, e que até a couro cheirava. Sacou de cima do cunhete de granadas que servia de mesa-de-cabeceira, o “Mont Blanc” genuíno que uma amiga lhe oferecera. Esticou o queixo e passou a boca do frasco directamente nas faces, estimulando a circulação com secas palmadas.
Decidiu que era altura de partir.
Fechou o apartamento a duas voltas de chave e lá foi pela galeria do sétimo piso: passada enérgica, arrastando ligeiramente os tacões, em direcção às escadas, enquanto ajeitava o lenço no pescoço assobiando.


sexta-feira, 9 de março de 2007

6 meses depois

Sei de cor cada lugar teu

atado em mim, a cada lugar meu

tento entender o rumo que a vida nos faz tomar

tento esquecer a mágoa

guardar só o que é bom de guardar

Pensa em mim protege o que eu te dou

Eu penso em ti e dou-te o que de melhor eu sou

sem ter defesas que me façam falhar

nesse lugar mais dentro

onde só chega quem não tem medo de naufragar

Fica em mim que hoje o tempo dói

como se arrancassem tudo o que já foi

e até o que virá e até o que eu sonhei

diz-me que vais guardar e abraçar

tudo o que eu te dei

Mesmo que a vida mude os nossos sentidos

e o mundo nos leve pra longe de nós

e que um dia o tempo pareça perdido

e tudo se desfaça num gesto só

Eu Vou guardar cada lugar teu

ancorado em cada lugar meu

e hoje apenas isso me faz acreditar

que eu vou chegar contigo

onde só chega quem não tem medo de naufragar

Mafalda Veiga

tirado d'aqui e modificado

quinta-feira, 8 de março de 2007

Mais um desafio!

As gatas não me poupam ;)
A continuar assim perco o fio e não há pedra d’amolar que me valha.

I. 7. Coisas que faço bem
1. Não ignoro desafios,
2. lanço-me facilmente à descoberta,
3. na cozinha é um descanso,
4. oiço e não calo,
5. uso o coração e poupo a cabeça
6. guardo para amanhã o que posso fazer agora
7. brinco a sério

II. 7 Coisas que não faço ou não sei fazer
1. Arrumar
2. Contornar, poupar e poupar-me
3. Cantar, assobiar ou tocar o que quer que seja,
4. Rever
5. Planear
6. Joguinhos
7. Limitar

III. 7 Coisas que me atraem no sexo oposto
1. O sexo oposto... com boa conversa
2. Franqueza
3. Sorriso
4. Elegância
5. Olhos faladores
6. Simplicidade e informalidades
7. Peitos pouco generosos

IV. 7 Coisas que digo
1. Portanto
2. O quê ou hã
3. Né?
4. Com’é qué
5. Vamos
6. Já?
7. Nunca t’enganei nem te torno a enganar

V. 7 Actores
1. Robert De Niro
2. Dustin Hoffman
3. Jack Nicholson
4. John Travolta
5. Michael Caine
6. Al Pacino
7. Hugh Grant
(se houvesse lugar para mais um era Erecteu ou Clint Eastwood, estou na dúvida)

7 Actrizes
1. Meryl Streep
2. Penélope Cruz
3. Jodie Foster
4. Renée Zellweger
5. Júlia Roberts
6. Catherine Deneuve
7. Juliette Binoche

terça-feira, 6 de março de 2007

a dor de preterir quem amo

= desafiado por la marée haute - vague =
Recordava tempos de infância ali vividos quando as brincadeiras fantasiadas tinham o sabor d’ Os Cinco na Ilha do Tesouro .
Caminhava agora pela praia rumo ao enorme rochedo, a que as gentes da terra chamam A Catedral do Mar, segundo a lenda, A Obra ao Negro sentenciada como castigo por ter pronunciado O Nome da Rosa, filha querida do rei que ali governava.
O uivo do vento e o fragor do mar, não mais são que o lamento e as preces do homem*, A Um Deus Desconhecido, implorando liberdade.




Os Cinco na Ilha do tesouro ", de Enid Blyton; il de Eileen Sopé (Notícias, D.L. 1991)

"A Catedral do Mar", de Ildefonso Falcones (Bertrand)

A obra ao negro”, de Marguerite Yourcenar (PÚBLICO, Colecção Mil Folhas)

"O Nome da Rosa" de Umberto Eco (Público, colecção Mil Folhas)

"A Um Deus Desconhecido ", de: JOHN STEINBECK (DOIS MUNDOS)

Os Cinco na Ilha do tesouro foi o primeiro, não que li, que esse não sei qual foi, mas o que li ao meu primeiro filho, e o que ele primeiro começou a ler, A Catedral do Mar é o último, o que eu estou a ler arrastadamente, por causa da "escrita"; A Obra ao Negro”, e O Nome da Rosa, fazem parte de uma triologia, à qual subtraí O Memorial do Convento,Blimunda e Sete-Sois me perdoem que Saramago tem coração maior que o nome; A Um Deus Desconhecido li-o no final da adolescencia e foi este que ofereci a uma jovem mulher que nunca tinha lido um romance.

*NÃO FOSSE ISTO UM DESAFIO E JAMAIS FARIA ESTE POST PORQUE AQUELES QUE PUS DE LADO FICAM A MORDER-ME, TAL QUAL UANHENGA XITU ("MESTRE" TAMODA) QUE FICA AQUI EM RODAPÉ A REPRESENTA-LOS E BEM PODERIA SER O NOME DO HOMEM, SE SEIS LIVROS ME TIVESSEM PEDIDO

segunda-feira, 5 de março de 2007

domingo, 4 de março de 2007

Há jogos a doer B VI

Bom, atendendo a que não houve uma maioria qualificada de comentários reforçando a deixa para pôr de lado esta treta, sinto-me na obrigação moral de cumprir o papel de Fernão Lopes, cronista isento, resistindo à tentação de apimentar a história com pormenores pitorescos ou pinceladas de carácter impressionista e muito menos surrealista.
Serei como até agora objectivo com enquadramentos de grande plano. Recorrendo a um ou outro close-up, não será com certeza para eliminar figura menos composta ou ambiência menos favorável.


-Nã pod’o quê? Rochinha até bufava.
Nã pecebes né? Ist’é a sério, e muita sorte têm vocês em eu apitar sem fiscais de linha.

Só faltava mais esta! O Silvinha a lembrar-se dos preceitos.

-Não têm um suplente? Vêm pá’qui armados em heróis de equipamento e tudo, mas…
-É um equipamento sem equipa, eheheh, mordeu reforçando o Senfim.
Os do USA, sentados no chão, apoiados nos braços ou em flor de lótus, já maldiziam Rochinha.
-O gajo punha o Biegas à baliza e tava tudo resolvido. -A simplicidade da solução ao alcance de qualquer um, não é?.
-Oh Rochinha cheg’aqui. Lá veio ele parlamentar, com os seus.


-A Nanny, desculpem, o Zé Galo, teve a ide…, o capitão/treinador nem deixou o Garrincha acabar.
–Entra o Biegas saio eu. A equipa tá feita e da ultima vez nã havia suplentes. E lá voltou para o conciliábulo.

Silvinha que já sentia a falta do apito nos beiços, lá teve que ceder, -Se assim querem, assim vão ter, cada um joga com o que tem, e o ISP se quiser usa o suplente, e o USA se tiver lesões, ou alguém se for abaixo das canetas, aguenta a tormenta.
Puxa da sua moeda oficial, exibe-a com toda a solenidade e pergunta ao Borrego, -Cara ou coroa? volteia-a no ar e...–azar do Borrego.
Destapa a moeda, pergunta ao Rochinha –Bola ou campo? E o Rochinha: –Bola.

A jogada estava ensaiada. Ao estridente e autoritário apito, Metomê dá um pequeno toque para Bicho, Bicho atrasa p’ó, p'ó guarda redes, a bola rola devagar, Penas persegue a bola, o Invencível carreeEGA em bloco, Zé Galo consegue apanhar a bóoola, chuta em arco, fortíssimo… Garrincha adiaaantado recolhe a bóoola, passe em profundidade, Meialeca desloca-se, está of-side, não está, o arbito não apITA o Invencível ficou parado clama of-siiiide…

-Ofsaide, ofsaiiiide, gritavam em coro os Invencível, enquanto acenavam os braços.
Os do União: -Vai Meia vai, -Vai Leca guinchavam .

… aí vai Meialéeeeca, completamente isolado, infleeecte, inflete para o centro do terreno; sai Cagante, sai Cagaaante, faz a mancha, Meialeca puxaaaaá bola pó pé esquerdo , Cagante estira a perna Meialeca remata, a bola parte, passa por baixo das pernas do guarda redes e é, é. não é, é é é Golo, Goooolo do USA, Gooooooolo!!!

Cinco, dez? vá lá quinze segundos de jogo, confesso que não sei!

O Invencível corria em bloco direito a Silvinha, Meialeca em pose de avião corria para os companheiros que para ele corriam. Toda a gente corria! Silvinha, esse, corria às arrecuas terminando no chão, fruto de falta de treino com certeza. Levanta-se aos Pris-Pris improvisados, envolvido pela indignação do Invencível.

-Eu é que sou o arbitro, lembrava ele.
-Nã vali, nã vali; -É golo, é golo –gritavam ao desafio.
-Bol’ó centro, sentenciou assertivamente Silvinha.
-Gatuno, ladrão, pantomimêro –de um lado
-Respêtem o arbitro –do outro
-Gatu…, Silvinha mand’á mão ao bolso que, mandam as leis,, em contra ordenação grave tem de puxar do cartão, mas... vê a malta do Invencível a avançar pa ele e… volta costas a correr.
-Moços dum cabrão, se querem arbitro vão ao Totta. E pernas pa que te quero.

Sai o arbitro… mudam-se os tércios.
Ainda Silvinha não tinha chegado à estrada e já a bola virava tourada em movimento uniformemente acacetado. Doze contra onze, ferve a cachaporrada! O USA remeteu-se logo para a táctica do quadrado, sim que as lições de história servem para alguma coisa, o Invencível ladeava o flanco cortando-lhes a retirada pó castelo.
Sopapo e pontapé, pontapé e sopapo as coisas ficavam feias para uns e sorridentes pó Invencível. Uma forte e ousada investida dá jus ao nome de Invencível: quadrado roto, desnorte nas hostes uniuninas, aconselhava a retirada em regime disperso.
Abalam uns para um lado outros pa outro, de olho por cima das costas quando se ouve o capitão:

-Voltem, caralho, voltem ,oh que os gajos enfardam no Biegas.

Confesso que, na confusão, até a mim me tinha escapado que o jogo afinal terminava empatado doze a doze

SMS


Entrou pela minha vida adentro de mansinho, instalou-se e foi bom.
Destroçou a minha auto-suficiência, encheu-me de atenções, tornou-me menos frias as noites.
Não dei pelo passar de quatro estações! Contei-as no momento em que a espera ansiosa pelo sms - Posso?; Queres?; Dás-me um copo? - se tornou na constante: -Vou a caminho.
Assim foi ou passou a ser. A merda da certeza destrói-me! Um rebuçado ou uma flor já não têm o mesmo cheiro ou sabor, envolvidos em papel de certezas. Irritam-me os seus cuidados, os silêncios contemplativos ou basta-me um: - Estás bem – para me revolver o estômago.
Só a sua volúpia e entrega ao prazer me refaz e apaga o desconforto.

O aviso de mensagem ecoa na minha cabeça, tardo a lê-la, o tempo passa e esqueço-a, concedo-me a liberdade de viver o meu espaço descondicionada e descontraídamente.
Tropeço com os olhos nele, como se me olhasse numa muda e reprovadora admiração, caio em mim precipito-me a abrir a mensagem:
Não apareço, Bjs



Aquele jeito de me tocar, de me envolver a cintura, de me beliscar a orelha, derreter-me as barreiras, violar-me os pudores, virar-me ao contrário o corpo e os sentidos da mesma forma que me e se inverte, desarrumar-me a cama e a alma, sugar-me os seios e os sentidos, apertar-me as nádegas e o coração, sufocar-me com beijos prolongados e depois partir ficando em cheiro na almofada.

Os seus olhos eram um espelho onde me revia na plenitude de uma felicidade desconhecida.

A formula perfeita

Nuno . Gomes = K
K=1

Contos da Meia Noite

A Filha do Patrão

sexta-feira, 2 de março de 2007

Apito B V

Isto começa bem, pensou o Silvinha.
O Silvinha, Sr. Silva, carteiro de profissão faz a volta logo pela manhã, depois é fácil encontrá-lo ao longo da muralha dando dicas a custo zero, a pescadores ocasionais e até aos de lugar cativo.
Personagem de referência desperta a simpatia na maioria do povo. Do alto do seu metro e meio e sob o peso dos seus 49 Kg mal aviados, impõe-se indiferente a risinhos ou veladas piadinhas. A única nódoa no seu desempenho social é a sua destreza no domínio da Casal Boss de duas velocidades.
Homem apaixonado, passeia-se com a sua Paulinha, braço sobre o ombro. Ainda não lhe chegou aos ouvidos foi o dichote posto a correr, por quem não digo, ainda que me matem: “A Paulinha é a paixão mas vem-se é com o futebol” – aquele Luís é lixado, se algum dia morder a língua cai pró lado com o próprio veneno.

Virtuoso do apito, Silvinha controla as situações de jogo com mestria em morses e intensidades próprias. Um Prrriiii, semibreve e seco confinou o ISP e o USA aos seus meios campos, chamando ao centro Rochinha e Borrego, capitães d’equipa.
–Como é, estamos aqui pa jogar ou querem barraquinha?
A profissão de fé unânime dos capitães qu’era mesmo pa jogar, era comprometida pelos gestos de Lambuça que, dando às asas com os cotovelos e esgravatando a gravilha, ensaiava uma dança em círculos . Do outro lado o dedo espetado do Bicho, contagiava o resto do USA.

Sério e grave começou com os considerandos, qual preambulo de diploma, do que o levava a apitar, aquele jogo, ele que já apitara o nacional – diga-se que omitiu a terceira divisão - advertiu que não admitia – a lista é tão extensa que me coíbo de a enumerar, para quase por fim mostrar-lhes duas cartolinas mais um bloco por fim, por fim mesmo, lhes pedir a lista dos jogadores.
Conhecendo vocês a do USA limito-me a revelar-vos a do ISP:
  1. Cagante
  2. Prego
  3. Cenoura
  4. Senfim
  5. Lambuça
  6. Carelhas
  7. Borrego
  8. Manhoso
  9. Dentinho
  10. Penas
  11. Galeira
  12. Careca

Com esta formalidade satisfeita, Silvinha dispensa os capitães, olha para o relógio e eis quando senão e de repente, saca das listas olha para uma e para a outra e volta a chamar os capitães.


-Isto assim nã pode sêri. Antão uma equipa tem onze e a outra dôzi? Ou há condições iguais ou nã há jogo


Assim não há pachorra, puta de vida, quem ainda acaba com esta merda de história sou eu.