sábado, 2 de junho de 2012

Gaitas


O Ti Alfredo Coelho já lá vai há muito tempo, descanse em paz.
Atacava com o mesmo a vontade e dedicação tractor agrícola, sachs e zundaps, motores de regas e tudo o mais que metesse bielas e cambotas, isto “pa nã” falar de frigoríficos a petróleo ou chocadeiras.
Era o que se pode chamar à semelhança dos médicos: “MECÂNICO GENERALISTA” (ou, como se usa hoje: DE FAMÍLIA), assim deveria constar no portão de sua garagem se tal fosse necessário...

Estou a vê-lo metido dentro do fato de macaco que daria pelo menos para duas lebres -Muito macaco sobrava ao Coelho! Revelando de falhas no marfim que a idade somara aos chupa-chupas da meninice estou a ver risos abertos, emoldurados num rosto seco e rudemente talhado sob uma cabeleira farta, negra e crespa que nem camadas de brilhantina punham na ordem.

Ti Alfredo, generosamente, não se negava a nada deitando mão a tudo e a todos que procurassem os seus serviços. Só não era generosos com uma pessoa – consigo próprio, pois, na hora do quanto é, coçava a gadelha torcia-se um pouco e a conta, sempre a mesma:
-Olha´, pá próxima... pagas tudo junto,

Como se vê não era homem para fazer mal a quem quer que fosse, tirando as porraditas que dava á mulher quando o Sporting perdia e o copito tinha ido para além da conta. Como o fato de macaco, era um grande homem enfiado em corpo pequeno, de simplicidade despreocupada que a terceira classe dotara de muita sabedoria e cuja alma tinha mais alminhas que o purgatório: ele era a alminha de artista, cantador de fados canalhas, era o desportista, ás do pedal e do jogo da malha; ele era o revolucionário distribuidor d’Avantes dando o corpo pela jornada de oito horas de trabalho, ele era o filósofo que meditava, meditava e, não encontrando solução para a questão, invariavelmente, rematava:
-Esta coisa tem gaitas!!!

Pois’é Alfredo, acreditas que não me lembro da cor dos teus olhos? Esta coisa tem mesmo gaitas!

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