segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Orçar

Já fomos muito bons marinheiros, aprendendo naufragando aqui e acolá, estudando e inventando aprendendo e ensinando, fizemo-nos aos mundo, enriquecemos e lamentavelmente empobrecemos, não por os recursos terem escasseado, mas porque à competente ciência naval não correspondeu uma competente governação política. O nosso Rei-Sol, D. João V, para sua glória, e nossa desgraça, deixou-nos o Convento-palácio de Mafra mais os seus carrilhões para conservar, num esforço que agora padecem muitas Blimundas e Sete-soís.

Depois com o advento da industrialização, os veleiros deram lugar aos vapores e paquetes. Foi um soltar de amarras e o proliferar de marinheiros. Para marinheiro passou a ser necessário saber fazer nós, fáceis de desfazer, soltar amarras, virar a proa a um destino e confiar que o São GPS (1) não falhe. Agora, marinheiros há muitos, mais do que as marés e tantos como os chapéus. Em cada jetski há um e em cada mota d’água dois ou três.

A navegação à vista de costa é, aparentemente, mais segura mas convém que não nos aproximemos demasiado pois ficamos mais sujeitos a percalços: golpes de mar; baixios ou rochedos submersos. Para passear serve, mas para quem tem um ponto de chegada longínquo, outro galo canta. Sabendo estimar a posição em que nos encontramos, em cada momento, há que manter o aparelho (2) afinado e se necessário, para vencer ventos contrários, bem saber bolinar (3) cerrando os dentes dispostos a fazer das tripas coração. Mas tal ainda não chega pois se em geometria a distancia mais curta entre dois pontos é uma recta, no mar o propósito não se alcança num só rumo, para lá chegar, mais rápida e seguramente, é preciso saber de ventos e correntes.
Orçar (4) não chega.

(1) GPS- Sistema de navegação por satélite
(2) Aparelho – conjunto de cabos, poleame e velame de um navio
(3) Bolinar – Navegar chegado ao vento, ou seja, próximo da direcção do vento.
(4) Orçar – Aproximar a proa da direcção do vento.
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8 comentários:

Bartolomeu disse...

Eis um verdadeiro e intrépido "Lobo do Mar", com uma vantagem especial, não meciona em caso algum a navegação em popa, tão-pouco em bolina larga, não vá o timoneiro distrair-se!
:))))
E porque fica aqui bem... digo eu, aqui deixo o "homem do leme", aquele que já nada teme, ou seja, "O MOSTRENGO" de Pessoa.
;)))

O mostrengo que está no fim do mar
Na noite de breu ergueu-se a voar;
À roda da nau voou trez vezes,
Voou trez vezes a chiar,
E disse: «Quem é que ousou entrar
Nas minhas cavernas que não desvendo,
Meus tectos negros do fim do mundo?»
E o homem do leme disse, tremendo:
«El-rei D. João Segundo!»


«De quem são as velas onde me roço?
De quem as quilhas que vejo e ouço?»
Disse o mostrengo, e rodou trez vezes,
Trez vezes rodou immundo e grosso.
«Quem vem poder o que só eu posso,
Que moro onde nunca ninguém me visse
E escorro os medos do mar sem fundo?»
E o homem do leme tremeu, e disse:
«El-rei D. João Segundo!»


Trez vezes do leme as mãos ergueu,
Trez vezes ao leme as reprendeu,
E disse no fim de tremer trez vezes:
«Aqui ao leme sou mais do que eu:
Sou um povo que quere o mar que é teu;
E mais que o mostrengo, que me a alma teme
E roda nas trevas do fim do mundo,
Manda a vontade, que me ata ao leme,
D' El-rei D. João Segundo!»

Erecteu disse...

Bart,
O poema vem a matar, mas eu aqui ao leme, vejo os que nos guiam mais ao jeito de um D. João VI.
Tento seguir os teus rumos mas só tenho noticia tua de há muito ancorado.
Bons ventos.

Maria Arvore disse...

Do império resta-nos esta geração D. Duarte de Bragança: de sorriso na boca mas gaga de ideias.

Erecteu disse...

Maria,
Fica por dizer o que de magnânimo fez o quinto.

vague disse...

tenho desafio lá me casa :)

Fernando disse...

Que se passa por aqui...
Tudo está tão parado...
E as músicas, quando voltam...?

Filipe disse...

no verão, se quiseres pomos o galo a cantar o hino da alegria

Fresquinha disse...

Venho desejar-te um Feliz Natal e que 2009 te leve a portos já esquecidos (como seja lá o tasco) em navegações triunfais. :-)

Boas Festas.