sexta-feira, 24 de novembro de 2006

Cem anos teria o professor Rómulo, poeta Gedeão

Faço um grande esforço mas não consigo imaginar que poema escreveria o professor Rómulo a Maria de Lourdes Rodrigues.

"Poema da malta das naus"

Lancei ao mar um madeiro,
espetei-lhe um pau e um lençol.
Com palpite marinheiro
medi a altura do Sol.

Deu-me o vento de feição,
levou-me ao cabo do mundo.
pelote de vagabundo,
rebotalho de gibão.

Dormi no dorso das vagas,
pasmei na orla das prais
arreneguei, roguei pragas,
mordi peloiros e zagaias.

Chamusquei o pêlo hirsuto,
tive o corpo em chagas vivas,
estalaram-me a gengivas,
apodreci de escorbuto.

Com a mão esquerda benzi-me,
com a direita esganei.
Mil vezes no chão, bati-me,
outras mil me levantei.

Meu riso de dentes podre
secoou nas sete partidas.
Fundei cidades e vidas,
rompi as arcas e os odres.

Tremi no escuro da selva,
alambique de suores.
Estendi na areia e na relva
mulheres de todas as cores.

Moldei as chaves do mundo
a que outros chamaram seu,
mas quem mergulhou no fundo
do sonho, esse, fui eu.

O meu sabor é diferente.
Provo-me e saibo-me a sal.
Não se nasce impunemente
nas praias de Portugal.

António Gedeão in "Teatro do Mundo", 1958

6 comentários:

Abssinto disse...

Acabei de ver na tv. Boa lembrança a tua:)Abraço

Maria Arvore disse...

Erecteu,
:)))

Eu julgo que o professor Rómulo dedicaria à Lurdinhas o início do "Espelho de duas faces" (Movimento Perpétuo, 1956):

Ajuda-me a esquecer as tuas faltas
e a ignorar os teus crimes
para melhor te amar.
Dá-me a febre em que te exaltas
e o que nos olhos exprimes
quando não sabes falar.

Espelho de duas faces, plana e curva;
és, e não és.
Imagem dupla, ora límpida, ora turva,
numa te afirmas, noutra te negas, em ambas crês.
(...)
(corto o resto porque de todo, não se adequa ;)

Maria Arvore disse...

E já agora que aqui estou, sempre digo que se a Lurdinhas obrigasse os professores a estarem mais tempo nas escolas, já estes não teriam a veleidade de fazer poesia. ;)))

Elipse disse...

pois eu acho que os professores fazem poesia sim senhor, mesmo sem tempo: poesia é coisa de flores... é coisa que se faz para converter em metáforas as agruras...
se os poetas não fizessem poesia morriam de mágoa por não poderem dizer em símbolos aquilo que ninguém quer ouvir em palavras reais.

Mas nem todos, nem todos: há os que falam muito e realizam pouco, como em todos os lugares do mundo em que se trabalha.

Elipse disse...

(fui eu que excluí o anterior... tinha-me enganado na identidade!)

Erecteu disse...

Ab,
A LEMBRANÇA DEVEMOS A MARIA.
fiz somente de caixa de ressonância.
Encaminho para Chez Maria a boa lembrança

Marie-Baum,
É isso que deixou dito porque a sua delicadesa não lhe permitia:

Ministra
vá à merda
não insista

Beijokas.

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Elipse,
è suposto os professores "DAREM AULAS"? A tal situação levou a semântica que já ofende pedirem que as deixem vender, ainda que baratuchas.
Bjs.