terça-feira, 30 de janeiro de 2007

O Guelas - Cópias minhas

Sim, não ia à escola há três dias. Saía de casa montava na carreta do Águamorna, nos quatro caminhos saltava e ala para o pinhal apanhar púcaras e outros cogumelos que não se podem comer mas que o Ti Alfredo compra, acho que para mandar para Espanha.
Hoje deu-me uma grande vontade de voltar.
Fui até lá mas não fui capaz. Fiquei no alto do cabeço de onde os via ir chegando e ficarem a brincar no recreio.
Eles estavam a jogar ao prego, elas brincavam à macaca.











Daqui ouço algumas vozes e distingui perfeitamente a voz dela. A sineta tocou, foram para dentro; o silêncio instalou-se; fiquei mais algum tempo, vi chegar o João a correr, atrasado como de costume, depois para ali fiquei na companhia do bico que não parava de piar. Dei-lhe algumas formigas, mas do que ele gosta mais ainda é de pão mastigado; começaram a crescer-lhe algumas penas, está espevitado e forte, vai safar-se com certeza. Cansado adormeci debaixo do pinheiro tendo acordado um pouco depois com frio. Fui até à vila e andei pelo mercado e pela rua junto ao rio; ía dando de caras com o mainate da herdade, o Severino, pirei-me a tempo, acho que não deu por mim.

***

A professora estava a corrigir os trabalhos de casa e nós a fazer uma cópia quando chegou um homem para falar com a professora. Ela saiu e a Joana ficou a tomar conta da aula; já apontou no quadro o nome do Rodrigo por se ter levantado e ter dado um carolo ao Rui, os outros desataram a rir e a gritar. Se ela não tirar o nome está tramado: fica sem recreio ou apanha, se calhar, as duas coisas porque não é a primeira vez.
A professora, voltou e trouxe com ela o Zeca. Ele foi para o lugar mas não se sentou; ficou de pé ao lado da carteira, a professora também não, ficou de pé em frente da secretária, virou a cara para ele e levantou as sobrancelhas. O Zeca disse:
-Peço desculpa, à soussora por ter saído da aula
-E…
-Por ter dito porra.
-Vais, ficar sem recreios até teres todas as cópias que não fizeste enquanto faltaste, senta-te.

Estou lixado, detesto cópias. Eles estão a brincar lá fora, gritam e riem, felizmente que tenho o bico por companhia, parece que ele gosta da escola, saltita no tampo da carteira, escorrega constantemente.
A Maria trouxe as amigas para brincar ao pé da janela, estão a jogar ao elástico,
agora está no meio, o cabelo e a saia saltam, está a abanar assim com a mão, parece que me está a querer dizer adeus,
olhou para mim, perdeu.

19 comentários:

Maria disse...

Eu não tinha jeitinho nenhum para jogar à macaca. Preferia jogar ao berlinde e fazer aviões de papel :)

beijinhos, boa 4ª feira

Lara disse...

ao ler este texto lembrei-me da escola primaria... as copias, os ditados, os castigos, as reguadas... jogar á macaca, ao elastico, ai que tempos tão fantasticos, cheios de inocencia!

beijo grande
adorei!

Erecteu disse...

Maria,
Também gostava dos aviões de papel.
E eu gostava de brincar às casinhas.
Bjs.


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A inocencia!
Lembro-me dela temperada com algum sentimento de culpa.
Beijinhos

rui disse...

Olá Erecteu

Recordações que me trazes com os teus geniais escritos.
Tudo tem o cheirinho a juventude, a aprendizagem, a alegrias e, traquinices e preocupações com os castigos.

Grande abraço amigo

Anónimo disse...

O que vale é que os amigos suavizavam os castigos.

Maria Arvore disse...

Antes perder um jogo que perder um amigo. :)

E com este texto recordaste-me a minha primária e toda a sorte de castigos a que sujeitavam as criancinhas como se o terror motivasse a aprendizagem, livra!...

E do horror que era quando me colocavam a tomar conta das outras e entre a raiva e a necessidade de dar a volta, negociava com elas ficar à coca para anunciar quando chegava a professora para depois anunciar com um sorriso falsamente cândido que todas nos portávamos como anjinhos.;)

Erecteu disse...

Rui,
Sinto que de alguma forma posso descrever um espaço e um tempo profundos.
O Daniel até poderias ter sido tu e eu a pontar-te o nome no quadro, para no último momento o apagar.
Era e decerto é, ainda, assim.
Um abraço

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Marta,
É verdade que as crianças têm uma grande dose de "crueldade" mas a sua componente solidária é muito superior.
Beijinhos

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Maria-Baum,
Atentíssima! Daqui pulo fazendo com a mão assim.
Beijinhos.

Rafeiro Perfumado disse...

Voltem, tempos do peão e do abafador... excelente, Erecteu, uma autêntica janela para a minha infância. Só não fiquei de castigo nem tinha um pássaro chamado bico.

rui disse...

Olá amigo Erecteu

Passei para rever o texto e de deixar um abraço.
O meu netinho já sabe jogar à macaca. :)))ehehehehe

Até a próxima visita

Abssinto disse...

Oh, velha infância... Lembro-me do sol a bater-me de chapa. Lá vai.

Abraço

Elipse disse...

estou a jogar (aqui dizíamos jogar "à semana"!), com uma malha feita de uma lasca de tijolo bem limado. aos saltinhos. parando, para tirar os cabelos dos olhos.
sabes... normalmente detesto este exercício de olhar para o passado e recuso fazê-lo.
Porém... aqui ele acaba por ser tão leve!!!

Teardrops disse...

Sempre nos trazes estas lembranças de uma forma doce e sem ser rebuscada... parece que estamos simplesmente a lembrar, não a ler!

Obrigada

Festinha da gata

Carla disse...

memórias de infancia...
beijos e bom fim de semana

Maria disse...

Bom fim-de-semana meu fofo ^-^

beijinhos da tua bolachinha

rui disse...

Oh! Erecteu,

Diz-me lá, foste tu que desenhaste estes bonequinhos, nas várias funções dos jogos?

Deixa que te diga, estão muito bem expressivos!

Grande abraço compadre

Erecteu disse...

Nã, Rui mêmigo, êi disênho bêm piori ;)
Uma abraço

sem-comentarios disse...

Alentejana como tu, essa história fez-me lembrar a minha infância.
Uma história bem alentejana :))

BFS **

Erecteu disse...

sem-comentarios,
Obrigado pela visita. Compõe-te que já lá vou espreitar-te.
Bêjos

DF disse...

Pronto, já tenho a leitura em dia! Voltei e roubei-te os desenhos, gosto deles. E do texto.
Bom fds